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Tradução: Note | Revisão: Pandine
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Capítulo: 04: Parte 01
“Filha da puta! Diga o porquê estava no MEU território!”
Cada palavra embebida em veneno que era rosnada por entre dentes cerrados, e pontuada pelo horrível e destoante som da pele colidindo contra o corpo de outra pessoa. Cada soco guinchava suavemente com o impacto, com o sangue da vítima escorrendo pelos nós dos dedos em cada golpe. O barulho dos dentes de Ayame era a menor de suas preocupações, considerando que ela era a vítima sendo surrada.
Ayame optou por não dizer nada em resposta às fulminantes exigências e cuspiu em silêncio um jorro de sangue no sapato branco da atacante. Um olhar enfurecido passou pelo seu rosto, quase que em câmera lenta.
“Bastarda… esses sapatos valem mais que a sua vida toda, sabia disso?”
Ayame suspirou suavemente através do nariz. Ela já tinha tido sua cota de ser colocada sob itens luxuosos por um dia.
Presa em um cômodo turvo, sujo e vazio, Ayame mal podia acreditar na situação em que havia se metido. A mulher atualmente choramingando – uma garota ruiva, com um apetite insaciável por violência – começou a andar ao redor da cadeira na qual Ayame estava amarrada, como uma hiena se esgueirando ao redor da sua próxima refeição. Se a dor não estivesse se tornando um pouco demais, Ayame teria achado toda essa situação incrivelmente divertida.
Era necessário muito para assustá-la, nesses dias. De um modo, ela estava satisfeita com a clemência auto infligida.
“Responda a porra da minha pergunta!” A jovem mulher rugiu. Ayame continuou quieta como sempre, e foi recompensada com um tapa no rosto pelos problemas que estava causando. “PORRA! Eu odeio vocês, vadias Tokugawa! Vocês são irritantes pra caralho!”
Ugh, isso é um saco… Ayame pensou. Como caralhos vou sair dessa?
Com uma repentina e desequilibrada risada, a garota ruiva desferiu outro golpe – desta vez, no estômago. Esse golpe foi seu melhor até agora, e o impacto fez Ayame se curvar em dor contra suas amarras, chiando por entre os dentes cerrados.
A garota grunhiu uma rancorosa gargalhada. Ayame se recusou a dar a satisfação de olhá-la nos olhos, e continuou a encarar as sombras abaixo da oscilante lâmpada enquanto seguia curvada sobre a cadeira.
Não consigo lembrar da última vez que alguém realmente me socou…
Era verdade. Realmente conseguir machucar Ayame em uma luta que tinha de fato alguma honra, teria sido impressionante; não era segredo que Ayame era uma incontrolável força da natureza, abençoada com instintos naturais que poderiam ter rendido uma bela carreira na luta profissional.
Quando a luta era menos que justa, porém, era diferente… e Ayame diria que ser amarrada em uma cadeira certamente a qualificava como ‘menos que justa’.
E pensar, que fui ordenada a ficar em casa para uma noite serena hoje. Como diabos chegou a esse ponto…?
Ah, é mesmo.
Assim como frequentemente começavam os problemas na casa Tokugawa – tudo começou com a Dona.
A parte mais calma do dia certamente foi o início da noite, que foi retornar para a mansão Tokugawa depois de um breve momento em um restaurante elegante. Uma direção tranquila acompanhada por uma música suave preenchendo o carro era sempre um luxo, e isso significava que Ayame podia roubar alguns olhares de Chinami no espelho do carro.
“Chegamos,” Chinami anunciou calmamente. Dona não disse uma palavra sequer enquanto saía do carro e fechava a porta atrás de si. Ayame fechou os olhos em irritação.
“Hm… obrigada. Por, uh. Por dirigir.”
Chinami piscou em surpresa e Ayame amaldiçoou sua estranheza. Felizmente, Chinami parecia tocada.
“… É claro. Tenha um ótimo dia, Ayame.”
Meu nome soa tão bonito quando ela o diz, Ayame pensou, antes de silenciosamente sair do carro também.
Depois daquele momento infelizmente acabar, Chinami saiu para transportar mais alguns gângsteres pela cidade. Ayame desejou saber para onde ela estava indo, mas também estava determinada a enterrar aquele sentimento no fundo de seu estômago.
“Vamos?”
O som da voz de Dona violou a bolha mental de Ayame. Dona não esperou por uma resposta antes de entrelaçar seu braço ao de Ayame.
As duas mulheres entraram novamente na mansão – com Dona cantarolando alegremente à medida que as duas caminhavam pelo hall da mansão. Ayame revirou os olhos, e Dona continuou a se aninhar nela enquanto seguiam.
“Só vamos logo,” Ayame demandou, tentando sacudir seu braço para fora da pegada de Dona. “Você está sendo pegajosa demais.”
Dona diminuiu o passo até parar por completo e, enquanto Ayame se virava para ver o porquê, ela traiçoeiramente aproveitou a oportunidade, como frequentemente fazia.
“Mas eu estou desesperada para sentir o seu calor, Ayame,” Dona sussurrou carente no ouvido de Ayame, com seu hálito assobiando sua voz feminina, e seus lábios roçando calorosamente contra sua orelha com cada palavra que falava. “Aah, eu preciso tanto que não consigo aguentar…”
A sensação de palavras sussurradas tão intensamente acariciando sua pele fez as costas de Ayame involuntariamente enrijecerem, assim como seu rosto ser inundado em um vermelho ardente.
Ela encarou Dona com os olhos arregalados e boquiaberta, presa em um carrossel de emoções enquanto ficava congelada no lugar: Repugnância. Choque. Raiva. Vertigem. Confusão. Luxúria? Não. Repugnância de novo.
“Ma-mas que porra?! Sai dessa!”
O olhar luxurioso nos olhos de Dona se derreteu para o escárnio que sempre refletia.
“Ah, minha nossa. Com o quão facilmente você se ofende, pensaria que é virgem, Ayame-chan. Você já foi tocada por uma mulher…?”
E com isso, Dona se soltou do braço de Ayame e se apressou pelos sagrados corredores da mansão Tokugawa com um risinho travesso.
Enrolando as mangas com uma carranca tão intensa que faria as Yakuza mais maduras evitarem seu olhar, Ayame finalmente começou a seguir Dona com passos altos e pesarosos. Ela ainda não havia decidido o que faria quando finalmente pegasse a mulher encrenqueira em suas garras, mas qualquer senso de vitória sobre Dona seria incrivelmente doce.
“Volte aqui, sua puta!”
“Ah, Ayame-san! Me pega! Me pegue se conseguir! Ahaha!”
Assim que Dona estava prestes a virar e sair de vista, ela freou e parou; com sua postura mudando para um sério profissionalismo tão rapidamente, Ayame se perguntou se ela havia alucinado com as coisas que acabaram de acontecer.
“Xiuying. Ayame. Parem de agir como adolescentes.”
Ayame se encontrou desacelerando até relutantemente parar, também. Somente uma pessoa ousava chamar Dona pelo seu nome verdadeiro.
Uma sombria e imponente figura saiu de trás do canto.
Diante delas estava agora Akira Tokugawa – a líder do clã Tokugawa e mãe de Ayame e Teru.
Akira era uma mulher que era respeitada e temida em proporções iguais e não sem uma boa razão. Ela tomaria medidas extremas para ter certeza de que qualquer dinheiro emprestado de sua família fosse restituído por completo; atreladas a uma montanha de interesses para apertar o laço ao redor dos seus chamados clientes. Uma das únicas coisas em que ela considerava Teru ser boa, era a chantagem, e foi aí que suas expectativas para sua outra filha pararam. Em relação à Ayame, suas expectativas eram muito mais altas, o que fazia Ayame frequentemente sentir um estranho e impulsionado sentido de orgulho pessoal.
Acompanhadas de suas táticas de extorsão, haviam rumores de que Akira tinha alguns podres de políticos poderosos. Enquanto Ayame acreditava que eram um pouco mais que rumores, o fato de que eles eram tão ativamente acreditados no submundo certamente ajudou a construir a reputação de Akira – assim como do clã Tokugawa – como uma força perigosa a ser temida.
A imponente mulher parada na frente de Ayame tinha cabelos pretos curtos, um olhar cortante em seus olhos vermelhos como um rubi e uma jaqueta preta pendurada sobre os ombros. A idade havia feito pouco para macular suas belas feições, na realidade, sua aparência só melhorava com o rastejar dos anos. Sua voz era baixa e gutural – rouca pelos anos de intenso fumo e gritos com os subordinados – mas era uma voz que comandava respeito e atenção. Até mesmo o jeito que pairava era profundamente intimidador.
Todas as boas e necessárias habilidades de uma ótima mãe.
“… Chefe,” Ayame cumprimentou curtamente e curvou sua cabeça. “Sinto muito pelo meu comportamento.”
Não, não sinto, Ayame pensou secretamente. Akira cruzou os braços através de sua blusa escura, suspirando pesadamente enquanto olhava para Ayame da cabeça aos pés. Dona permaneceu ao seu lado com o mesmo sorriso enfurecedor que Ayame aprendeu a detestar.
“Poupe seu fôlego, Ayame. Temos muito o que discutir.”
“Eu sei,” Ayame disse suavemente, estremecendo ao detestável sentimento de algo rastejando sob sua pele à medida que o olhar condenante e superior a fulminava. “Presidente Sugimoto, certo?”
Akira balançou a cabeça.
“Não. Bem… não somente a Presidente Sugimoto.”
Ayame levantou uma sobrancelha. A gravidade do que sua mãe estava falando começou a afundar.
“Espera, o quê…?”
É difícil de explicar, porém… mais alguma coisa havia acontecido.
“… Explicarei no meu escritório,” Akira respondeu bruscamente enquanto girava sobre seu salto. “Você tem três minutos para aparecer.”
E com isso, Akira estava fora de vista, deixando nada além de um rastro de fumaça de cigarro pairando no ar. Dona também já estava longe, tendo se apressado atrás de cada movimento de Akira, deixando Ayame sozinha no corredor.
Suspirando cansada, a solitária Tokugawa pressionou suas mãos nos quadris em confusão.
Mais alguma coisa…? Mas que diabos está acontecendo aqui…?
Incerta do que esperar de Akira no dado momento, as gêmeas Tokugawa eram raramente surpresas ou intimidadas por sua mãe distante. Sua família era fodida, incomum, fria e um pouco áspera nas bordas, então deste modo, talvez elas fossem uma família totalmente normal, afinal.
Um nervosismo a agarrou à medida que se aproximava do imenso par de portas estampadas com o brasão da família. Levantando a mão cuidadosamente, Ayame finalmente encontrou a força em si para bater na porta três vezes.
“Entre,” Akira anunciou.
Com o ranger da maçaneta, Ayame entrou no cômodo à sua frente com um sentimento familiar de ansiedade.
“Perdão pela intrusão,” ofereceu, obrigada.
Akira assentiu com a cabeça.
“Sente-se,” ela disse, sem entusiasmo.
Ayame adentrou o cômodo de aspecto luxuoso que pertencia a sua mãe, e imediatamente teve seus sentidos agredidos pelos cheiros de fumaça e bebidas finas que pairavam ao redor dela como neblina. Ela balançou a cabeça tentando dispersar os odores enquanto fechava a porta atrás de si.
Ayame olhou ao redor do escritório de sua mãe; um lugar com o qual deveria estar familiarizada, porém, a quantidade de frívolos e luxuosos ítens que foram colocados dentro de um só cômodo conseguiu, de algum modo, surpreendê-la cada vez mais toda vez que entrava.
Similarmente ao resto da mansão, as paredes eram decoradas com um profundo vermelho que gritava grandeza, aparadas com ouro nas beiradas para um toque de riqueza. Haviam peças antigas raras feitas de ouro e prata nos arredores, assim como grandes pinturas a óleo das antigas matriarcas Tokugawa em seus auges penduradas nas paredes.
Apesar dos itens luxuosos e móveis, o ego era certamente a parte mais cara deste cômodo. Akira não mantinha em segredo que possuía um sentimento inabalável de orgulho estando no topo da cadeia alimentar; esta era claramente a sala de alguém que não era apenas vista como chefe por aqueles que lideravam, mas que sem sombra de dúvidas, via a si deste mesmo modo.
Ayame tentou não deixar o quão inúteis essas coisas eram para ela, mas nunca conseguia.
Levantando de sua cadeira, Akira andou até as largas janelas atrás dela e se virou para olhar o grande pátio do território Tokugawa. Tomando outra lufada do cigarro, ela exalava poder enquanto permanecia ali com suas costas viradas para sua filha. Ayame esperou com o ar suspenso e não podia fazer nada além de encarar as costas de sua mãe pelo que pareceu uma eternidade.
“… Primeiramente…” Akira finalmente começou, inclinando a cabeça levemente em direção ao seu ombro enquanto olhava para o pátio. “Quero saber o que aconteceu ontem à noite.”
“Ontem à noite?”
“Chegou aos meus ouvidos que você estava coberta de sangue e que a única coisa capaz de te acordar foi um balde de água gelada,” Akira respondeu abertamente, “Isso é inaceitável.”
Dona…! Aquela dedo duro do caralho!
“Eu não precisava de um balde para me acordar, mãe. Esse foi só o jeito que Dona escolheu para arruinar minha manhã–”
Akira se encarregou de acabar com a conversa ao andar até Ayame antes que ela conseguisse terminar a frase.
“As empregadas terão um dia duro, esfregando sangue no carpete pela segunda vez em uma semana. Me foi dito que você tem um gosto por empregadas, mas se essas são as medidas que você toma para conseguir ver seus uniformes…”
Ouvir sua mãe trazer à tona seu histórico de relacionamentos já é vergonhoso o suficiente para lhe render bochechas coradas, mas ainda por cima, Ayame se sentiu como uma criança levando bronca por suas ações. Ela mordeu o lábio para reprimir a raiva borbulhando dentro de si e Akira suspirou.
De algum modo, com aquele suspiro, o clima caiu um pouco também.
“Você a matou?”
“Quem?”
“Quem mais? Eu não escutei um pio sobre a tenente Himekawa com quem mandei você conversar. Claramente ela não seria estúpida o suficiente para ignorar um chamado das Tokugawa.”
“… Sim,” Ayame finalmente respondeu. “Ela está morta.”
Os olhos de Akira pairaram de cima a baixo em sua filha com profunda desaprovação.
“É bom que tenha feito conforme disse. Aquela punição existe por um motivo.”
“Está me perguntando se a desmembrei? Porque é claro eu o fiz,” Ayame respondeu a rispidamente, sua paciência finalmente começando a se esvair. “Por que acha que estava coberta por tanto sangue? Foi… nojento.”
“Então não o faça novamente.”
Ayame sentiu um repentino frio percorrendo sua espinha enquanto Akira se virava com um brilho medonho em seus olhos.
Isso era mais do que uma mãe repreendendo sua filha – isso era um aviso.
“… Posso apenas me desculpar, chefe. Sinto muito.”
Na frente dos outros, Ayame referiria a sua mãe com nada mais do que “chefe” e ponto final. Sempre foi desse jeito e ela já estava velha o suficiente para ser útil para ela. Quando eram Ayame e sua mãe sozinhas, Akira poderia ser chamada de mãe um pouco mais facilmente, mas isso não significava que as dinâmicas de poder eram verdadeiramente diferentes.
Akira exalou sua fumaça como um dragão antes de dar as costas à sua filha.
“Eu espero mais de você, Ayame. Não me decepcione uma segunda vez.”
Ayame sentiu um indesejado senso de culpa recair sobre seus ombros e curvou relutantemente sua cabeça.
“Não acontecerá novamente.”
Akira simplesmente zombou.
“Você não queria me dizer alguma coisa?” Ayame perguntou, querendo rapidamente mudar de assunto e também sentindo um repentino nervosismo. “Não aconteceu nada com a Teru, não é?”
Akira tomou uma pungente pausa, inalando mais uma lufada de seu cigarro, Ayame sentiu seu coração pulsando em seus ouvidos enquanto o mundo parecia desacelerar ao seu redor.
Merda… foi mesmo Teru? Ela não estaria mais chateada se Teru tivesse morrido?
Na verdade, não, ela provavelmente não estaria…
“Ontem à noite, simultaneamente à morte da Quarta Presidente Sugimoto,” Akira finalmente falou, “Ryuko Mishima foi morta a tiros em seu escritório.”