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Tradução: Note | Revisão: Pandine
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Capítulo 03 – Parte 01
Depois de deixar Teru no Canário Azul, somente Chinami e Ayame permaneceram no carro.
“Para onde gostaria de ir, chefe?” Chinami perguntou, inclinando levemente a cabeça em direção a Ayame.
A outra Tokugawa estava se apoiando para frente em seu assento, mãos entre os joelhos e cabeça abaixada. Seu cabelo bagunçado se pendurava obscuramente ao redor de seu rosto, lançando uma sombra sobre ele. Ela permaneceu naquela posição curvada por algum tempo, não proferindo som algum.
“… Casa,” Ayame finalmente respondeu. “Para casa está bom.”
“É claro.”
Nem Ayame e nem Chinami eram muito falantes em seus melhores momentos, mas estavam particularmente quietas agora. Ayame intimamente sentia falta da presença de Teru neste momento, já que a solidão a deixava com nada além de seus pensamentos e Teru tinha um talento natural para quebrar o gelo e aliviar qualquer clima.
Se havia apenas uma vantagem neste estranho clima, era que deu a Ayame tempo de sobra para observar as características de sua motorista sob o disfarce da noite e do profissionalismo. O espelho do retrovisor estava perfeitamente impecável e sempre iluminado pelo brilho peculiar da interface do rádio. Um tom arroxeado capturava perfeitamente os lindos traços de Chinami, mesmo quando obscurecidos pela sua máscara.
Chinami Saizuki parecia uma mulher misteriosa e pela primeira vez em quem sabe quantos anos, Ayame verdadeiramente se encontrava querendo saber pelo menos um pouco mais sobre outra pessoa. Mas se ela efetivamente faria algo sobre isso, ou não, fica a ser descoberto.
Agora, Ayame Tokugawa sentia nada mais que uma dormente sensação de alívio. Alívio de que a noite estava acabando, alívio de que ela estava prestes a ir para a cama e tentaria esquecer a violência deste dia em particular, desde agora até nos anos que viriam, ao relembrar de seu passado.
“Chegamos,” Chinami anunciou silenciosamente e Ayame deixou escapar um pequeno som de surpresa ao inesperadamente ouvir o som de sua voz. Com toda certeza, elas conseguiram voltar para o território Tokugawa inteiras.
Abrindo a janela elétrica do carro com um zumbido mecânico, Chinami pressionou seu dedo na campainha do pequeno alto-falante do lado de fora dos portões gigantescos.
“Chinami Saizuki com Ayame Tokugawa,” ela contatou monotonamente.
E como um relógio, os portões se abriram novamente para os luxuosos pneus do carro emprestado de Chinami rolarem pelo pátio.
Apesar dos insetos do verão estarem fazendo diversos barulhos à distância, a mansão em si estava quieta. A propriedade dos Tokugawa era uma estrutura detestavelmente grande composta de múltiplos edifícios. Era situada longe dos olhos curiosos da polícia ou outras organizações “do bem”… Pelo menos, é assim que Ayame descreveria.
Para os punks ranhentos que haviam se juntado recentemente ao ranks Tokugawa, era um lugar luxuoso cheio de riquezas para serem tomadas, se eles pudessem passar pela porta sem se mijarem de animação. Para os membros mais antigos, era uma norma ter ouro e prata espalhados por todo lugar. Para os Tokugawas conectados por sangue, era pouco mais que um triste lembrete de que a mulher no comando de seu clã valorizava posses materiais brilhantes acima de tudo mais, até mesmo o valor da carne humana.
Ayame cambaleou para fora do carro, quase tropeçando em si mesma por exaustão. Uma faísca de irritação atravessou Ayame, pelo fato de seu próprio corpo a estar traindo…
“Você ficará bem entrando, Ayame-san?”
“Eu já te disse para largar essas porras de formalidades…!” Ayame rosnou instintivamente.
“… Minhas desculpas.”
A irritação de Ayame sumiu imediatamente e foi rapidamente substituída por um temeroso arrependimento cravando em seus ossos. Ayame coçou a parte de trás de seu pescoço, tentando seu melhor para parecer calma.
“Uhh… Ficarei bem. Ainda consigo andar, então… está tudo bem.”
Chinami assentiu enquanto Ayame deslizava as mãos nos bolsos.
“Como quiser. Então, irei até o incinerador antes de retornar.”
A família se referia como “O incinerador”, mas na verdade, era somente uma fogueira gigante que o clã Tokugawa usava para queimar seus crimes. Era um buraco despretensiosamente cavado em um terreno abandonado. Depois que algo era queimado, as cinzas eram deixadas aos caprichos dos ventos tumultuosos que, com certeza, iriam espalhá-las posteriormente. Ayame, em sua nebulosa mente, havia esquecido completamente no caminho até aqui – os restos corporais ainda estavam no porta-malas.
“Ah, merda… desculpa, eu esqueci. Você quer que eu vá com você?”
“Por favor, não se preocupe. Sou familiarizada com o procedimento.”
“… Você já fez isso antes?” Ayame perguntou em surpresa.
Os óculos de Chinami brilhavam levemente pela luz da porta da frente dos Tokugawa.
“Sim,” ela respondeu de modo simples.
Bem, droga. Não posso discutir com isso. Mas essa não é a primeira noite dela no trabalho…?
“Tudo bem então,” Ayame disse, apesar da dispensa ser hesitante e insincero. “Até mais.”
Chiname curvou a cabeça silenciosamente, ainda que, logo antes dela se virar para sair, seus olhares se cruzaram por um tempo surpreendentemente longo.
Imagino qual será a dela, Ayame pensou para si – Apesar de que, na realidade, Chinami Saizuki a havia cativado mais do que ela se importava em admitir.
Mas agora não era o momento para pensar nisso, ou qualquer outra coisa. Agora era hora de tomar um banho quente e dormir. E a hora de dormir significava hora de não ser perturbada por um tempo.
Com um alto rangido, Ayame abriu as portas desnecessariamente pesadas da mansão Tokugawa com suas reservas de força e cambaleou para dentro.
“Eugh…” Ayame estremeceu à medida que as luzes da mansão cegavam seus olhos de coruja noturna. “Brilhante demais. Ninguém por aqui tem senso algum de estilo, juro por Deus…”
Enquanto as pesadas portas batiam fechadas atrás dela, as mulheres que haviam sido designadas para a guarda noturna olharam para sua pessoa ensanguentada com uma leve hesitação por trás de seus olhares.
“… Bem vinda de volta, Ayame-sama…” Elas disseram, uma a uma, todas com um oscilante, patético tom de medo abrasivo e tensão apreensiva.
“O quê? Vocês acham que vou matar vocês ou algo do tipo?” Ayame disse zombando.
“Ah, querida. Quem pode culpar as cordeirinhas por estarem assustadas quando está desse jeito?”
A cabeça de Ayame chicoteou ao redor ao som os passos silenciosos se aproximando e uma voz que Ayame conhecia bem demais para o seu gosto.
“… Dona,” ela cumprimentou brevemente.
A mulher conhecida como Dona deslizou seu caminho até o lado de Ayame e sorriu com um ar traiçoeiro.
“Boa noite, Ayame-chan.”
“Não me chame assim.”
A aparência monocromática de Dona não mudou muito através dos anos.
Seu cabelo ainda era preto-azeviche e perfeitamente liso, caindo até a base de sua coluna. Seus olhos eram acentuados por uma camada de delineador preto, acompanhado de um sempre presente senso de escárnio por trás e ela sempre usava um sorriso insincero com uma facilidade alarmante. Era considerado um mau presságio dentre o clã Tokugawa ver Dona mostrando alguma emoção que não fosse aquela máscara de sorriso.
Dona sempre se esgueirava pela mansão Tokugawa em um quimono longo cinza, um ar preguiçoso que nunca falhou em dar nos nervos em irritação no fundo da mente de Ayame.
“Então, o que você aprontou hoje à noite?” Dona incitou, se inclinando levemente para frente, com as mãos unidas nas costas. “Algum leve esporte sangrento? Um homicídio triplo?”
Ayame virou os olhos.
“Eu assassinei dez mil pessoas. Não dá para ver?”
“Uau!” Dona balbuciou. “Isso é um novo ponto baixo, até mesmo para você. Ou talvez não seja.”
Dona é assim desde que Ayame a conhece. Ela era uma mulher misteriosa e em uma ambiguamente alta posição de poder para alguém que mantinha tantas cartas escondidas na manga. Conversas ao redor do bebedouro dos Tokugawa sugeriam que ela era a segunda matriarca no comando… Mesmo que ninguém verdadeiramente soubesse.
Ela tinha mesmo a influência para mandar nas gêmeas Tokugawa e isso por si só, já era um poderoso status de se ter. Ayame era, aproximadamente, um nível abaixo de Dona no clã Tokugawa. Teru, graças ao seu comportamento despreocupado e movido a garotas, era dois.
“O que você quer?” Ayame perguntou com irritação. “Estou cansada.”
“Aposto que sim, aqueles assassinatos não se carregam sozinhos, certo?” Dona riu por trás de sua mão esbelta. “Enfim… alguns desenvolvimentos muito interessantes aconteceram enquanto estava fora fazendo… seja lá o que estava verdadeiramente fazendo. Assumo que esses dez mil assassinatos foram por conta de uma piada infeliz?”
“Eu preciso mesmo dizer que foi uma piada…?”
“Sim, precisa.”
Ayame suspirou com um franzir de sobrancelhas.
“Sim, foi uma piada. Ha, ha, ha. Então, o que aconteceu? Desembucha.”
Os olhos de Dona se iluminaram com um lampejo de raiva e os cantos de seu sorriso vacilaram um pouco; o sorriso ameaçando cair em uma profunda carranca. De todo modo, quando o assunto era expressão em seu rosto, Dona tinha um controle anormal e conseguiu manter o sorriso emplastado em seu rosto, como habitual.
“Não fale com sua chefe desse jeito, Ayame-chan.”
Era a vez de Ayame sentir as chamas da ferocidade em seus olhos enquanto Dona dizia isso. Teru sempre brincava como essas duas se matariam um dia, mesmo que, em tempos como esses, isso parecia menos uma piada e mais uma profecia.
“Bem, eu divaguei…” Dona continuou, “Tenho notícias especialmente interessantes. Aposto que vai morrer quando ouvir.”
“É mesmo?”
Um sorriso de pura alegria se espalhou pelos lábios de Dona. Ela parecia estar vibrando positivamente em animação.
“A Quarta Presidente Sugimoto… morreu.”
Os olhos cansados de Ayame estavam, momentaneamente, descansados e arregalaram consideravelmente.
“Quê? Morreu?”
“Sufocamento,” Dona respondeu com um largo riso. “Seus oficiais imediatos já pegaram o responsável… ela está sendo amarrada agora enquanto conversamos.”
A morte de uma Presidente deveria acontecer apenas uma vez na vida de uma Yakuza, de velhice, tipicamente.
Ayame deu um passo em frente, com total descrença estampada em todo seu rosto e Dona saboreou calmamente o sentimento de ser a portadora de tal conhecimento.
“Bem? Quem foi?!”
“Acredite ou não, foi uma das garotas que trabalha na casa noturna Oceano Rosa.”
“Uma… uma garota do clube matou a Quarta Presidente? Sério?”
“Isso mesmo,” Dona confirmou, sua voz atada a uma risada rancorosa. “Parece que foi algum tipo de brincadeira de asfixia que deu errado… bem, acredito que tenham jeitos piores de se morrer, hm? Posso somente sonhar em morrer no meio das minhas maiores fantasias.”
Ayame não iria dividir sua opinião com Dona, de todas as pessoas, mas ela simplesmente era incapaz de acreditar neste desfecho. Era impossível que uma mera garota de clube tivesse sido capaz de se livrar da cabeça mais poderosa do mundo Yakuza no Japão, por acidente, ainda.
Pelo jeito que Dona estava falando, certamente parecia que essa morte não foi planejada. Mas isso significava que as coisas ficariam muito mais interessantes entre as famílias que foram mantidas unidas sob a insígnia Sugimoto.
O clã Tokugawa era somente um entre muitos, afinal.
Raro do modo que era, Ayane sabia que quando uma Presidente morria bem no topo da cadeia alimentar, a Yakuza restante entrava em um frenesi. De algum modo, sempre parecia que a cola que os segurava juntos em uma silenciosa, respeitosa harmonia, se deteriorasse imediatamente e as terras que uma vez compartilhavam tão pacificamente, agora tinham o potencial de se tornarem um campo de batalha.
As líderes de cada família agora tinham um senso intransigente de responsabilidade de manter todos unidos até que uma nova Presidente fosse eleita, apesar de que, quem seria, ninguém podia realmente dizer.
“Então, o que acontece agora…?” Ayame perguntou, mesmo que não esperasse uma resposta.
“Eu não sei a resposta para isso…” Dona confessou, à medida que seu rosto caía em uma expressão mais sombria, “… Mas eu te amo, Ayame-chan. Eu prometo que você ficará bem.”
“Nunca na minha vida eu acreditei menos em alguma coisa,” Ayame murmurou. Faltava-lhe energia para realmente surtar com a mulher que estava na sua frente e ao invés disso, optou por deixá-la constantemente rolando sobre ela.
Dona deu um maior ainda e mais desagradável, sorriso e riu consigo.
“Bem, estou indo para a cama. Você realmente deveria tomar um banho… deixe-me passar os dedos por esses lindos cabelos seus.”
“Não fode.”
“Boa noite para você, também.”
Dona passou por Ayame, ainda usando seu confortavelmente desconfortável sorriso emplastado no rosto e em segundos, tinha desaparecido nas escadas acima, seguidos de alguns passos amortecidos.
Ayame sentiu seu estômago torcer com uma incerteza corrosiva enquanto se arrastava escada acima, deixando suas pernas levá-la ao quarto automaticamente.
O que ela quis dizer…? Teria uma guerra de gangues por quem ascenderia ao papel de Presidente? E sobre o funeral? Todas as famílias seriam reunidas sob o mesmo teto, pela primeira vez em sabe-se Deus quanto tempo?
“Ugh…!” Ayame grunhiu raivosamente, e seu arrastar rapidamente se transformou em pisões enquanto marchava para seu quarto. “Eu não tenho a energia para pensar sobre isso… Que droga, Dona! Aposto que ela me contou sobre isso só para me tirar do sério!”
Ayame socou o gesso duro da parede da mansão duas vezes enquanto andava e não era nem remotamente sutil, já que agora tinha sangue seco manchava o papel de parede creme que as revestia.
Abrindo e batendo a porta com um baque raivoso, Ayame cerrou os punhos e respirou profundamente.
Tanta violência. Tanta morte. Ainda mais em seguida, agora. Lampejos do corpo da tenente que ela cortara vieram rastejando pela sua mente e deixaram um gosto terrível em sua boca. Cada um de seus membros começou a tremer vigorosamente e sua respiração começou a vir rápidas, rasas lufadas, que atacavam dolorosamente seus pulmões.
Pensamentos mais calorosos de Chinami Saizuki, uma motorista que ela conheceu somente esta noite conseguiu se esgueirar através da névoa vermelha que preenchia sua cabeça; assim como pensamentos de Teru, sorrindo e fazendo piadas pela noite no meio do caos. Mesmo com essas bolhas de pensamentos, repentinos choques de ansiosos pesadelos inundaram-na também. Foi uma fusão desconfortável que girava pela sua mente e incansavelmente e continuou até que Ayame se distraiu pela visão de um quarto, uma vez estático, começando a ondular ao seu redor. Era sempre muito brusco quando isso acontecia.
Alucinações enquanto cansada e emocionalmente fragilizada era algo mais comum do que não. Este era o momento em que Ayame Tokugawa mais queria desligar seus pensamentos dos traumas do dia e simplesmente ir dormir.
“Calem a boca…” Ayame conseguiu cuspir, agarrando sua cabeça enquanto afundava de joelhos contra o carpete. “Calem a boca… calem a boca!”
Atirando seu punho contra o carpete em uma fútil tentativa de fazer sua mente se calar, ela começou a finalmente sentir a energia do seu corpo sendo drenada, deixando-a como nada mais que uma casca no chão.
Calem a boca…
Por favor… por favor, fiquem quietos…
Eu só quero dormir…
…
… Tão rapidamente quanto entrou no quarto, Ayame Tokugawa tinha agora desmaiado no chão, permitindo que a escuridão da noite a levasse silenciosamente em seu abraço, enquanto o mundo dos Tokugawa começou a girar a seu redor, em algo que logo seria um frenesi de procura por poder. Por conta das engrenagens do destino que continuavam a girar, a Presidente Sugimoto não era a única poderosa Yakuza que morreu naquela noite – mas Ayame teria que esperar para descobrir que notícia era essa.