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Tradução: Note | Revisão: Pandine
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Capítulo Três
Eu consegui escapar do barracão depois de meia hora e vaguei pelo campo quase deserto. Fui para o checkpoint onde nos registramos, fora do prédio principal. Pegando minha bagagem, percebi uma bolsa plástica com um cobertor e lençóis e outra com equipamentos de natação novinhos. Minha mãe planejou isso nos mínimos detalhes.
Uma sensação de formigamento surgiu na base do meu pescoço. Um senso de perigo espreitava quando aquele arrepio surgiu. A primeira vez que senti essa adrenalina de ansiedade foi na noite em que a Lauren e o Mike me deixaram sozinha naquela árvore. Agora era um terror sem sentido no meio do dia, metros de distância dos limites do acampamento, onde as árvores ficavam, mas não era algo que eu conseguiria controlar logicamente.
Tentando meu melhor para parecer o mais casual possível, encontrei olhares com alguns estranhos olhando através das janelas do prédio de recreação. Deveria ter ficado na cabana – era bem melhor que ouvir quaisquer que fossem as instruções, espírito de acampamento, ou qualquer outra merda que fosse falada naquele lugar.
Abandonando todas as intenções de realmente atender a cerimônia de boas-vindas, deslizei para dentro da minha cabana, depois de procurá-la por dez minutos, já que esqueci os números que pertenciam aos Castores.
“Aqui, deixe-me te ajudar com isso.” Uma voz repentina me fez pular.
“Acho que consigo – não. É impossível.” Quando me virei, ali estava uma pessoa de aparência frágil, tipo um duende, de cabelos pretos e espetados. “Posso ser a pessoa menos atlética que já existiu, mas poderia te afastar com meu dedão.”
“Estou sentindo um desafio.”
Comparada com a mala, ela era pequena. “Está considerando aceitar?”
A garota pegou da minha mão e segurou a mala como se não pesasse nada, me deixando de boca aberta. Ela levantou no ar para colocar a mala no compartimento em cima da minha cama, então desceu com um sorriso largo.
“Talvez você queira se sentar,” ela sugeriu, claramente entretida. “As pessoas costumam ficar irritadas em pé. Essa aura. Eu curti.”
Subi na cama pela escada e a garota voou para o meu lado, eventualmente puxando meu travesseiro no seu colo. Dobrei meu casaco ao meu lado e murmurei para mim, “Eu juro solenemente nunca mais julgar um livro pela capa.”
“Isso pode te salvar um tempão,” ela concordou.
“Você está me julgando agora,” eu acusei.
A garota colocou uma mão sobre seu coração e caiu em uma risada tilintante. “Tenho a sensação de que vamos ser melhores amigas, Emma.”
“Como sabe o meu nome?”
Séria, ela disse: “Sou psíquica.”
“Espera, o quê?”
“Relaxa.” Ela virou a etiqueta no meu casaco. “Crachá nas suas roupas?”
“Aqui está escrito Lane,” eu disse, levantando uma sobrancelha.
“Você estava no meu ano na escola. Sentava na minha frente na aula de economia. Sempre me fez amarrar seu avental. Nunca devolveu o favor, Srta. Lane, você sempre me deixou provar sua comida e sempre estava incrível.”
Um dos efeitos colaterais da depressão profunda era a perda de memória, então não fiquei surpresa de não lembrar dela. “Prazer em te ver de novo…”
“Gwen,” ela finalmente completou para mim. “Ninguém me nota na escola. É Gwen Black.”
“Prazer em te conhecer de novo. Se ajuda, eu mal me notava naquela época.”
“Posso entender suas tendências bizarras. Afinal, sou de uma família meio insana. E isso sendo educada. Mas isso, nome nas roupas? Não, isso não faz sentido. Você tem que explicar.”
“Nunca se sabe quando alguém pode querer reivindicar algo como deles,” eu disse.
“Esse é o seu motivo? Não te vejo sendo toda devota à arte de comprar roupas.”
“É um dia de viagem.” Olhei para baixo para as roupas do acampamento, então para as calças cinza que tinha usado antes, jogadas no outro travesseiro.
“Falando nisso, por que não está na assembleia?” Gwen perguntou.
“Por que você não está?” retruquei.
“Como eu disse” – ela sorriu – “destinadas a sermos melhores amigas, Emma.”
“Você esteve aqui em Maplewood antes?”
“Aham. Meu nome é Black, afinal,” ela disse.
“Seus pais são donos do lugar?”
“Culpada. É um negócio familiar. Tecnicamente ainda sou uma campista, mas meu irmão mais velho e minha irmã são conselheiros.”
“Pelo menos agora conheço alguém legal por aqui,” disse.
Pelos próximos minutos, campistas andavam ao lado da janela, deixando-nos saber que a assembleia tinha acabado. Felizmente, ninguém da minha cabine voltou imediatamente.
Gwen desceu da beliche e falou sobre a coincidência de que ela, também, não planejava ficar no acampamento até o final e que o tempo passava rápido. Seus pais insistiram que ela passasse o verão com seus irmãos, Walter e Vivian, antes que fosse para a faculdade. O Sr. Black também amarrou seu irmão Manny para ser o enfermeiro do acampamento pelo verão. O lugar todo era comandado pelos vários membros da família Black, incluindo a mãe da Gwen, que estava encarregada da cozinha.
Olhando para mim com olhos arregalados, Gwen perguntou, “Tudo bem se eu colocar meu número no seu celular? Sabe, para depois do verão? Concretizar nossa amizade?” Ela subia e descia com os pés, preparando para implorar. Ela olhava no meu peito bem pontudo, onde tinha colocado meu celular, por segurança. Era um esconderijo terrível. Tirei da minha camiseta e deslizei da cama para que ficássemos cara a cara. “Prometo não exagerar nos emojis.”
“Não me importo, eu acho…”
Rápida como um raio, ela pegou o celular das minhas mãos e digitou rapidamente. Quando peguei meu celular de volta, seu número estava lá, junto com vários corações ao lado do nome dela e até mesmo uma foto perfeita dela sorrindo para a câmera. Gwen me agarrou para um abraço mortal. Com isso quero dizer que ela me abraçou tão apertado que achei que minhas costelas fossem quebrar. Ela pode ter percebido quando comecei a tossir e cuspir sobre estar vendo a luz.
“Vou organizar minhas coisas antes do almoço, talvez arrumar a cama,” Gwen disse. “Não seja uma estranha.”
“Você fica aqui do lado,” observei, mas ela não apaziguou. “Quero dizer, você disse que seríamos melhores amigas.”
“Ah, e Emma? Realmente deveria esconder esse celular.”
Conforme ela girou e andou para fora da cabana com um rápido e gracioso pulo, eu vi uma estranha flor laranja no cabelo dela.
Gwen estava certa. Por mais que quisesse, não podia sair por aí com um celular enfiado no meu sutiã. Tinha que ter um esconderijo nessa cabana, algum lugar que um conselheiro não pensasse em olhar, até que estivesse realmente pronta para quebrar as regras. Não tinha motivo para tentar me fazer ser expulsa no primeiro dia, especialmente quando não havia ninguém para me buscar. Meu pai estaria a horas de distância a esse ponto. Por mais que quisesse ver aquela van azul brilhante dele do lado de fora do acampamento, a imagem do seu rosto cansado depois de horas de viagem me levou a procurar um bom lugar de esconderijo na cabana.
Debaixo do travesseiro? Arriscado demais. Fora minha bagagem, o único espaço pessoal que tenho é minha cama, e mesmo assim, só a cama de cima. Nosso banheiro era pequeno e já estava abarrotado com todas as nossas coisas pessoais e os suprimentos genéricos de higiene que foram colocados ali antes de chegarmos. Debaixo do colchão? Testei o lugar, deitando na cama de baixo e olhando para cima. Era visível entre as ripas da cama, e quando me estiquei para pegá-lo, uma tábua mais alta que o normal no chão debaixo da cama da Lauren chamou minha atenção. Com uma mexida, a tábua se moveu. Quando a deslizei para o lado, um pequeno buraco apareceu. Ninguém pensaria em olhar aqui. Depois de enrolar o dispositivo em um moletom, escondi o celular dentro do buraco.
Chegando à hora do almoço, não precisávamos procurar nossa própria comida. Quando compartilhei esse pensamento em voz alta com a mulher nos servindo, ela me deu a mais estranha das expressões, empilhou uma gosma mole no meu prato e me disse para mandar ver. Não tinha energia para pegar nada que não fosse batatas depois da sua aparente dispensa.
A cantina já estava cheia até o teto, então me sentei, com a minha bandeja, na mesa de piquenique do lado de fora. O resto do grupo dos Castores logo saiu e me viu. Se aconchegaram com Jessie e Abby de cada lado meu, Lauren na minha frente junto com a Kendra e os caras à minha direita na outra ponta da mesa, falando entre eles. A única pessoa dos Castores que não estava aqui era a Gwen.
“Isso é tipo, uma coisa?” perguntei, cutucando a Jessie assim que ela sentou. “Todos os outros grupos estão misturados. Mas os Castores ficaram juntos.”
“Somos genuinamente amigos, é por isso,” Jessie disse.
“A Gwen ainda está na nossa cabana?” perguntei.
Lauren tossiu e me encarou com um olhar semelhante ao de um goblin, como se a ideia de ser amiga da Gwen fosse absurda. Ela estava com a mesma expressão do dia que me deixou sozinha naquela árvore. Como eu não reconheci aquela cara imediatamente? Claro, bloquear aquela memória era o único jeito de seguir em frente, mas quando fomos agrupadas juntas pelo Sr. Black, e então quando estávamos na cabana, ela não parecia familiar. Sabendo agora quem ela é? Seria difícil esquecer.
Ela tomou um gole do seu suco de maçã, mantendo contato visual comigo. Ela se lembrou de ter feito aquilo comigo? Não tem jeito dela saber de como me deixar lá em cima tinha me impactado desde então, mas isso não significava que queria perdoá-la. Pelo menos não até que ela se desculpasse. Quando Jessie abriu sua boca para responder, Lauren olhou para ela, calando sua resposta. Havia um brilho nos olhos da Lauren, como se ela gostasse do poder que tinha sobre seus amigos, mas mais importante, ela queria me impressionar, por algum motivo irracional. Por trás de seus olhos orgulhosos, ela não percebia que estava, na verdade, fazendo exatamente o oposto.
“Não sei como a Gwen é parte da família Black. O irmão e a irmã dela são tão legais. Ela é esquisita demais para ser um deles.” Lauren olhou ao redor e levantou uma sobrancelha. “Especialmente o cabelo dela. Você já viu? Ela é uma aberração. Dança em qualquer lugar que vai. Quão estranho isso é?”
“Ela parece bem bacana para mim,” disse.
“Confie em mim.” Lauren tomou um gole da bebida dela. “Ela não é. E é por isso que não está sentada aqui. Mas não importa como ela seja. É bem garantido que ela consiga aquela vaga de conselheira ano que vem, depois que o Connor sair. Olha só como o resto deste acampamento é gerenciado. Julie Black, Philip Black, Manny Black, Walter Black, Vivian Black… ano que vem a Gwen se juntará a eles. Como isso é justo com alguém?”
“Essencialmente, você a isolou.” deduzi. “Com quem ela se senta na escola?”
“Por que se importa?” Lauren perguntou.
Peguei minha bandeja e levantei. “Mesmo que não conheça a Gwen muito bem, ou num geral, sei que ela é bem melhor que seu traseiro mandão.”
Lauren levantou para me encarar. “Como se já tivesse falado com ela.”
Ignorando-a, me virei para procurar minha nova amiga. Lauren reagiu imediatamente espirrando suco de maçã por toda a minha camiseta do acampamento. Em um segundo estava virada para o chão, no outro eu virei minha bandeja bem na cara da Lauren, batendo no nariz quadrado dela. Purê caiu na blusa dela. Talvez tenha saído um pouco de sangue do nariz dela.
“Oops.”
“Vou te matar, “ ela rosnou, limpando o purê de cima. “Vou, literalmente, matar você.”
“Literalmente literalmente, ou literalmente?”
“Quê?”
“Tipo, literalmente, realmente não vai acontecer, ou vai literalmente tirar a minha vida?”
“Quem você acha que é? Poderia arruinar você. Completamente te arruinar. Igual eu fiz com a droga da Gwen Black.”
Dizer que estava desapontada com a reação do grupo de Castores era pouco. A maioria deles eram nerds bonzinhos que não gostavam de confronto, se as expressões horrorizadas em seus rostos queriam dizer alguma coisa. Mike, bem, Mike sempre foi um seguidor dela, assim como quando tinha doze anos, me deixando plantada naquela árvore durante uma tempestade, talvez porque a Lauren o tenha dito, ou talvez porque haviam decidido juntos. De todo modo, aposto que foi a Lauren que decidiu me deixar lá. E Abby sempre foi uma garota quieta, pelo que me lembro, então as coisas não mudaram muito por aqui. Chocantemente, Jessie, apesar dos muitos pensamentos que mostrou nas suas cartas, não tinha uma palavra para dizer em resposta a essa cena. Que diabos aconteceu com ela depois que saí de York?
Tentei dar o meu melhor para limpar minha camiseta no banheiro da cantina, mas o cheiro de maçãs não saía e o melado do tecido se recusava a se desfazer. Acabei tentando amarrar a camiseta em um nó, deixando a parte inferior da minha barriga à mostra. Por um segundo eu hesitei, mas quanto mais pensava sobre isso, mais percebia que as pessoas não dariam a mínima sobre minha barriga tanto quanto eu dava.
As pontuações casuais de Lauren sobre a Gwen me deixavam furiosa. Aquilo nem era o pior; era o fato de que Jessie e o resto dos Castores não faziam um movimento sequer para se oporem ao que a Lauren disse sobre a Gwen e a família Black. Ou eles se calavam e não enfrentavam a Lauren, ou toleravam o comportamento constante dela em isolar a Gwen.
Jessie cruzou meu caminho conforme me juntava à multidão indo para a próxima assembleia. “Essas pessoas são meus amigos. Não pode criar drama porque sua mãe te abandonou aqui pelo verão. Não é culpa deles se não gostamos da Gwen. Algumas pessoas simplesmente não se dão bem. É a vida, Emma.”
“Parece que o único motivo deles não gostarem dela é por conta de quem a família dela é. Isso não está certo.” Puxei meu cotovelo para fora do aperto dela.
“Olha, a Lauren sempre quis ser uma conselheira. Ela está falando disso há anos e só terá uma vaga no próximo verão. É claro que ela está furiosa. Ela não tem chances contra a Gwen.”
“Ainda é bullying, Jessie,” zombei. “Está dividindo quarto com a Gwen, não está? Talvez a Lauren e a Gwen possam trocar de quartos. Deixar vocês juntas.”
“A Lauren quer dividir o quarto com a Abby.”
“Certo, então nós duas podemos trocar.”
“Eu quero dividir com a Kendra…”
“Pareço que eu dou a mínima?”
“Não,” ela disse, virando para encarar onde as cabanas dos conselheiros ficavam. “Você não dá.”
“É como se você tivesse uma personalidade totalmente diferente. Suas cartas fizeram soar como se você fosse pelo menos decente.”
“Olhe para você. Ainda a mesma solitária e depressiva Emma Lane. Não mudou nadinha.”
“Pelo menos nunca vou seguir alguém como a Lauren. Ela é uma valentona. E o fato de você defendê-la e não a Gwen, fala tudo que preciso saber de você.”
Minha pele coçava e me arrependi de ter mandado aquelas cartas para Jessie, expondo meus pensamentos mais profundos e sombrios para alguém que pensei que fosse uma confiável colega de pena. Me movendo para o mais longe que pude, esperei o Sr. Black atribuir um conselheiro para os Castores. Abby me deu um aperto empático no braço conforme parei ao lado dela, a salvo da Jessie e da Lauren. O ar delas era tóxico.
“Espero que fiquemos com o Walter,” Abby disse, apontando para um cara grande com cabelo ondulado. “Ele é competitivo. Seus campistas sempre ganham competições cara a cara entre grupos. E mesmo que seus campistas não ganhem, eles não perdem tão feio. E mais, ele é legal.”
“Não, não acho que queira ele. Tem alguém relaxado? Quero ficar de boa de fora, talvez torcer para vocês se não estiver cochilando.”
“Talvez o Connor? Mas se os grupos do Walter e do Connor estão se enfrentando, eles são assustadoramente competitivos. O mesmo com a irmã do Walter, Vivian. Fica… complicado.”
Alinhados contra a parede, os Castores e os Águas-viva eram os dois últimos grupos para receberem um conselheiro. Um dos conselheiros estava atrasado, o que significa que o Sr. Black atribuiria um grupo para o conselheiro atrasado assim que ele chegasse. Não sei sobre a lógica para relacionar um grupo com um conselheiro, mas confiei que ele sabia o que estava fazendo.
“Primeiro, Águas-vivas,” o Sr. Black disse, batendo as mãos juntas. “Estão designadas ao meu filho Walter e Castores, estão designados à minha filha, Vivian. Por não termos tempo para organizar outra atividade, podem jogar queimada aqui, depois de receberem seus cronogramas das atividades diárias do acampamento. Se tiverem quaisquer dúvidas ou preocupações, procurem seus conselheiros ou passem no meu escritório.”
“Por que a ficha só está caindo agora?” perguntei, olhando para minha direita, para Gwen, que se divertiu com a minha surpresa. “Você tem, tipo, um número ilimitado de irmãos gerenciando esse lugar.”
“Só o Walter e a Vivian.” Gwen os dispensou, acenando sem preocupações para outros campistas. “O irmão do meu pai, Manny, está ali – o cara com uma carranca permanente na cara. Ele provavelmente faz isso todo ano. Ele faz inventário dos rostos que provavelmente vai tratar.”
“Tratar?”
“Ele é enfermeiro. Meu pai amarrou todos que podia para passarem o verão aqui. Então o Manny está aqui meio período.”
“Posso me identificar.”
“ O acampamento também não estava no seus planos?” ela perguntou.
“Não.” disse. “Queria passar o verão com o meu pai.”
Ela colocou a mão no meu ombro, oferecendo um aperto simpático. “Ele te mandou para cá?”
“Não. Minha mãe tem visitação garantida pela corte, mas então ela foi para um cruzeiro. Ou uma lua de mel. Ela me deixou aqui no caminho e fugiu com o novo marido dela. Sua desculpa era que queria eu socializasse mais.”
“Drama,” ela sussurrou para si.
“Drama, estúpido e inútil.”
“Ainda sim, você me conheceu.”
“Missão cumprida.” Acompanhei seu sorriso. “Mas vale a pena, por ter que jogar queimada?”
“Jogue e descubra!” Gwen riu.
Esse era o ponto, realmente não queria jogar. Queimada requer paciência, furtividade e energia, e eu não tinha nenhum deles. Além do mais, trouxe de volta memórias de ficar alinhada na parede da aula de educação física e não ter meu nome chamado. Ser a última pessoa restante geralmente decidia a que time me juntaria. Tênis guinchavam na quadra e vozes ecoavam no ambiente e restos da ansiedade se acumulavam na boca do meu estômago conforme nos alongávamos na quadra. Queimada nunca foi divertida; nunca seria divertida.
A porta abriu com um baque alto e era impressionante como uma pessoa conseguia comandar um cômodo tão rápido quanto essa garota o fez. Com cabelos ondulados pretos que acabavam pouco acima dos cotovelos e sua cabeça erguida, ela passeou pelo cômodo de recreação. O clicar rítmico dos sapatos dela adicionaram ao som de bolas esportivas quicando. Todos pareciam cativados pelo movimento dos lábios dela. Ela era linda, como a visão externa da janela de um carro em uma noite limpa – não importa o quão impressionante a paisagem fosse, as estrelas sempre conquistavam minha atenção.
Seus olhos se encontraram com os meus e ela riu. Não sei como parecia aos olhos comuns naquele momento, mas não ri de volta, não imediatamente. Ela não parecia familiar. Se eu visse alguém como ela no passado, eu certamente lembraria. O problema é que, pelo jeito que ela olhou de novo, parece que ela me conhecia.
O irmão da Gwen vaiou e pulou na sua outra irmã, apontando na nossa direção, causando seu humor visivelmente azedo, piorar. Vivian. Nossa conselheira. Não podia culpá-la. Ela foi deixada para os Castores. Nosso grupo sozinho disse tudo o que ela precisava saber. Não seríamos vitoriosos.
“Ainda não posso acreditar que a Vivian Black é nossa conselheira,” Lauren disse, seus olhos brilhando.
“ Nepotismo no seu melhor!”
“Deu um bom jeito naquele suco de maçã, não é mesmo?” ela disse.
“Realmente.”
Lauren, de má vontade, jogou uma bola na minha direção. Gwen girou como uma bailarina na minha direção, então, com suas mãos delicadas nos meus ombros, me levou para o lado para que a bola me errasse completamente. Nós duas andamos para o outro lado da linha de queimada.
Os Águas-vivas se reuniram ao redor de Walter como patos, enquanto os Castores estavam assustados demais para se aproximarem da Vivian.
“Vamos lá, Em, ela é quase inofensiva,” Gwen disse, pegando minha mão. “Juro de dedinho, ok?”
“Precisamos entrelaçar os dedinhos para isso funcionar, Gwen.”
“Certo, o que estava pensando?” Ela parou abruptamente e entrelaçou seu dedinho com o meu. “Ela é inofensiva.”
“Preciso passar pelo processo entorpecente de explicar as regras para você?” Vivian disse.
Eu quase engasguei com a minha saliva, porque aquela voz familiar, angelical, pertencia apenas à garota do barracão. Não é de se surpreender que ela tenha me olhado daquele jeito. Foi ela que me trancou lá e me deixou sozinha para me virar. Gwen bateu de leve no meu queixo, para colocá-lo no lugar.
“Corra, pegue a bola, então a jogue,” Lauren respondeu, se arrumando sob a atenção de Vivan. “Quão difícil pode ser?”
“Para os Castores? Geralmente é catastrófico,” Vivian disse.
“É um grupo amaldiçoado,” Gwen me conta.
“Somos os segundos maiores roedores do mundo,” murmurei em incentivo, virando para ficar no fim na linha, tentando não encarar o time dos Águas-vivas – Eles têm tanto músculo.
Gwen bateu no meu ombro de leve e disse, “Meu pai estaria tão orgulhoso.”
“Se apenas fôssemos as capivaras, seja lá o que isso for.”
“Os maiores roedores do mundo,” Gwen gracejou.
“Hilário,” respondi sem expressão.
A determinação de Gwen ia de encontro com a dos Águas-vivas conforme ela pulava para cima e para baixo com os pés, se preparando para a partida, tamborilando os dedos nos meus ombros. O resto dos Castores não tinha o mesmo entusiasmo. Abby e Kendra ficaram com os braços cruzados, enquanto Jessie e Lauren nem ao menos olhavam da queimada, ocupadas demais sussurrando uma com a outra. Os caras do nosso time estavam paralisados – sua derrota aparente antes mesmo do jogo começar. Vivian se inclinou contra a parede com alguma revista e uma expressão entediada no seu rosto. Walter gritava encorajamentos das laterais da quadra, animando seu time. O único indicativo de que Vivian estava envolvida no jogo era o apito entre seus lábios. Quando ela determinou que todos estavam atrás da linha, ela apitou.
“Corre, Emma!” Gwen torceu, graciosamente pegando uma bola do chão e jogando em alguém.
“Não.” Me recusei, não me movendo um milímetro sequer.
“Corra, ou será espancada!”
“O chão me parece confortável.”
Gwen atingiu um cara de um metro de oitenta no ombro, tirando-o do jogo. “Vai doer.”
“A dor é o menor esforço.”
“Cara,” Mike grunhiu, esfregando onde ele foi atingido no joelho.
Eu evitei um acerto no meu braço direito e deixei a bola quicar na parede atrás de mim, mas não fui tão sortuda da segunda vez quando um borrão vermelho bateu contra a minha bochecha esquerda. Meus joelhos falharam pelo impacto, mas consegui ficar em pé. A linha da quadra, pintada de branco no chão, se movia como uma cobra. Nem percebi a dor, mas então, bem abaixo do meu olho ficou quente e a pontada se tornou proeminente. Então o silêncio me deu a dica de que estava esparramada no chão.
“Ela está no seu time.” O Mike disse em tom acusatório. “Isso é… é simplesmente estúpido, Lauren.”
“Oops,” Lauren disse.
“Vou te mostrar o oops.” Eu sentei, rolei para minha lateral, peguei a bola e a arremessei no alvo. Lauren se virou a tempo da bola bater na parte de trás da cabeça dela.
Uma risada alta veio do outro lado da quadra, em resposta aos acontecimentos caóticos. Walter perguntou: “Que diabos está acontecendo com o seu time, Viv?”
“Autossabotagem,” ela disse, sua cabeça inclinada para o lado.
“Está mais para vingança,” murmurei, indo para a linha de fundo.
“Você não foi tirada do jogo,” Vivian me disse.
“Mike pode ficar no meu lugar, não pode, Mike?” perguntei.
Ele me deu um toque com as mão. “Sim, vamos ganhar essa coisa! Faremos por você, Emma.”
Ele correu para a quadra e uma bola imediatamente atingiu sua virilha. Uma onda de oohs circulou a quadra. Mike foi deixado abatido enquanto mais dos Castores eram tirados do jogo. Gwen girava por aí, pegando bolas do chão e jogando nos Águas-vivas com precisão perfeita e na velocidade da luz. Era como se suas mãos fossem catapultas perfeitas forjadas no inferno para queimada.
Peguei uma garrafa de água no banco, sem me importar de quem era e pressionei contra minha bochecha quente.
“Isso é anti-higiênico,” Vivian comentou.
“Sua cara também.”
O aroma de rosas me cercava e senti a presença de uma pessoa delicadamente sentando ao meu lado. “Você deve ter orgulho do seu humor.”
“Isso te deu uma carranca, não é?” Até falar era doloroso. “Ai!”
Seu dedo cutucou minha bochecha, me fazendo sibilar, gaguejar e me inclinar para trás, me fazendo cair do banco.
“Você está sorrindo por quê?” Ela perguntou, olhos se estreitando. “Sua bochecha está inchando.”
“Por que você não me reportou?”
“Quanto tempo você levou para sair do barracão?” ela perguntou. Então, “Você precisa de gelo.”
“Estou bem.”
Ela me encarou sem expressão. “Você está bem?”
Eu me empurrei até que tivesse espaço suficiente entre nós para que ela não conseguisse cutucar minhas bochechas de novo. Mas a Vivian não era a única ameaça no ambiente. Eu me afastei demais e uma bola me atingiu na parte de trás da cabeça, forçando minha cabeça a bater nos meus joelhos. O lugar ficou imediatamente quieto e eu senti lágrimas dando pontadas nas minhas feridas. Minha audição fez uma viagem para longe para se salvar da destruição que me parecia atrativa.
“Emma? Você está bem?” Eu grunhi minha resposta. “Shh. Tem tanto sangue,” Gwen disse, voltando a correr os dedos pelo meu cabelo. “Vou levá-la a enfermaria e você resolve…”
“Você ainda não é uma conselheira,” Vivian disse brevemente.
“E importa?” sua irmã perguntou, soando um pouco chorosa. “Ela é minha futura melhor amiga.”
“Estou bem,” constatei.
“Eu vou levá-la,” Vivian disse. Outro par de mãos me ergueu para meus pés. “E você, você não está bem. É como se você quisesse que eu te provasse o quão mal você está com minhas cutucadas no seu rosto.”
“Eu já disse que você é má?” perguntei.
“Uma ou duas vezes, sim,” Vivian disse.
Com uma mão cobrindo meu rosto, eu entrelacei meu outro braço com o de Vivian. Andando através do acampamento com meu rosto sangrando tanto era levemente vergonhoso. As pessoas encaravam muito. Era como se nunca tivessem visto sangue ou alguém que apanhou de uma valentona com uma bola de queimada.
O que tornou a jornada pior foi o quão perfeita a Vivian era; ela não tinha um olho roxo proeminente e um nariz meio sangrento. Tudo sobre ela – a compostura, o caminhar flexível, o olhar que mantinha as pessoas longe o suficiente, mas perto o bastante para encararem sua clara beleza – era perfeito. E então, tinha eu, a batata desajeitada.
“Eu não sei como alguém consegue se acertar no rosto com os joelhos.”
“Você bate seu rosto contra um osso oposto, e voilà!”
“Só passou um dia,” ela sussurrou.
“Está indo tudo de acordo com os planos,” eu disse. “´É ferimento suficiente para me mandar para casa?”
Ela me ajudou a subir os degraus e bateu na porta da enfermaria do acampamento, ao lado do escritório do Sr. Black no prédio principal. “Um dia, e você já fez inimigos. Talvez seja uma boa ideia se fazer ser expulsa. Acaba com o drama. Salva seu corpo do trauma.”
“Eu te disse,” falei.
A porta balançou aberta, revelando não o enfermeiro, mas o próprio diretor. O Sr. Black piscou lentamente enquanto processava meu rosto. Quando sua filha o cutucou para o lado, ele nos deixou passar, rapidamente limpando a cama dos equipamentos novos.
Meus pés se penduravam para fora da cama, balançando para frente e para trás, no ritmo da minha tontura. Ao invés de dor aguda vindo em pequenos intervalos, uma dor maçante constante tomou conta.
“Tinha um mau pressentimento, deixando você e o Walter encarregados da queimada.” Ele direcionou seu comentário para sua filha. “Como isso aconteceu?”
“Não é minha culpa se as crianças… brigam. Além do mais, é o nome do jogo.”
“Crianças?” perguntei.
“Sim, crianças,” Vivian confirmou.
Ela não podia ser tão velha assim. “E quantos anos você tem, exatamente?”
“Não é da sua conta.”
“Dezenove,” seu pai respondeu.
“Pff, por favor. Você mesma ainda é um bebê,” acusei.
Vivian encarou a parede com os braços cruzados, se recusando a reconhecer as duas pessoas no cômodo.
O Sr. Black saiu do cômodo para pegar um pacote de gelo. Não nos mexemos o tempo todo em que estava ausente.
“Vou chamar o Manny, ele ajudará com o inchaço,” ele disse quando voltou. “Por enquanto, fique com isso.”
“Obrigada,” disse grata, recebendo o pacote de gelo enrolado em um pano de prato.
“De nada. Devo esperar mais alguma casualidade?”
“Não,” Vivan disse.
“Talvez,” respondi. “O Mike Hanley levou uma bela bolada.”
Vivian finalmente me notou. “O Mike foi atingido?”
“Está me falando que imaginei o Mike sendo atingido nas partes íntimas?”
E nem um momento depois, Walter, junto com seu tio Manny, carregaram um Mike com cara de desmaio para o cômodo e o colocaram no sofá. Vivian não pareceu se importar que dois dos seus campistas foram machucados. Estremecendo de dor, coloquei o pacote de gelo contra a minha bochecha. “Coitado.”
“Você está se sentindo algo além de bem?” ela perguntou, inclinando a cabeça para o lado.
“Nah.”
“Você é insuportável.”
“Nah.”
“Pai,” Vivian disse, “já temos crianças machucadas o suficiente para acabarmos com essa atividade?”
No final, o Sr. Black decidiu que queimada era violenta demais para permitir que continuasse, e precisava ser substituído por outra atividade mais branda, como handbol ou badminton. Manny me deu um passe para descansar na enfermaria por uma hora. Vivian deixou para trás o cronograma para eu dar uma olhada e vê-lo me fez desejar que Lauren tivesse me machucado o suficiente para que fosse mandada para fora do acampamento. Dormir até mais tarde no verão? Impossível. Das oito até as dez teríamos artesanato, então uma atividade em grupo escolhida pelo conselheiro até o meio-dia. Então tínhamos a hora do almoço. Das duas até as cinco tínhamos que participar de atividades físicas, fossem no centro recreativo, caso chovesse, ou no quintal atrás das nossas cabanas, ou atividades aquáticas no lago. E então, finalmente teríamos o jantar às seis e meia da tarde.
É um cronograma lotado e tenho certeza absoluta de que não gostei nem um pouco de como isso soa.