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Tradução: Gabrielfsn | Revisão: Gabrielfsn
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A Fuga Começa
Quando ela desceu do trem para a plataforma, seu primeiro pensamento foi Quanta fumaça, mas ela estava enganada.
A jovem de cabelos pretos segurava uma passagem de trem na mão enquanto olhava ao redor da estação multilinha, inclinando a cabeça, confusa com a vista curiosa.
Ela era uma garota encantadora, com características juvenis mais bem descritas como “fofas” do que “lindas.” Seu busto atraia os olhos para sua blusa, mas seu traje no geral era elegante e refinado, e ela o usava com completa naturalidade.
Akari Tokitou: uma perdida evocada de outro mundo, com um poder assustador chamado de Puro Conceito ligado à sua alma.
Seus olhos escuros, normalmente cheios de energia, atualmente pareciam um tanto tristes. A tiara que frequentemente mantinha seu cabelo bagunçado no lugar não estava com ela, pois a deixou aos cuidados da amiga em que ela mais confiava neste mundo.
Akari insistiu em deixar um pequeno símbolo de suas posses com Menou, para que ela soubesse que Akari havia partido por vontade própria.
Com sua cabeça ligeiramente mais leve que antes, Akari olhou em volta através do estranho nevoeiro.
O chão pavimentado com paralelepípedos produzia um som satisfatório a cada passo. Pequena, mas criada cuidadosamente, a plataforma parecia estar coberta por algum tipo de névoa.
Mas se fosse fumaça, haveria cheiro. E se fosse neblina, Akari deveria ter sentido a umidade na pele. Enquanto procurava por uma explicação, ela logo percebeu o que era.
Não era nenhum tipo de vapor, mas partículas minúsculas e luminosas.
Luz Etérea.
Essa era a manifestação da “energia” usada para criar conjurações neste mundo. Akari procurou pela origem e rapidamente a encontrou.
Os trens Etéreos parados na estação produziam Luz Etérea quando seus apitos a vapor soavam. O brilho fosforescente vinha dos motores Etéreos, que eram usados para transportar passageiros. Estava saindo tanta do trem que fazia a plataforma parecer nebulosa.
Akari sorriu um pouco com a vista. Era muito diferente de tudo que ela viu no Japão.
Ela se lembrou de um momento há dois meses atrás, quando sua companheira de viagem produziu bolhas luminosas através de uma moeda de cinco in para fazer uma criança feliz.
“Me pergunto o que Menou está fazendo agora…”
Menou era a querida amiga de Akari. Uma que ela conheceu neste mundo. Aquela garota era mais importante para Akari do que qualquer um e qualquer outra coisa. Ela sempre esteve ao lado de Akari protegendo-a, mas agora ela não estava presente.
Akari suspirou.
Sua nostalgia havia se transformado em tristeza. Tentando se livrar do clima solene, ela estendeu a mão e agarrou o ar para ver se conseguiria pegar a luz.
Não houve sensação em sua palma. As partículas brilhantes deslocadas pelo movimento da mão de Akari se dispersaram, desaparecendo como a breve passagem do tempo.
Enquanto ela observava a Luz Etérea dançando diante de seus olhos, uma pergunta surgiu no fundo da sua mente.
O que era exatamente a Força Etérea, afinal?
Enquanto a base da civilização no antigo mundo de Akari era a ciência, a raiz da maioria dos avanços neste mundo era a conjuração.
Força Etérea, uma energia que não existia na Terra, era um aspecto tão fundamental deste mundo que fazia parte da definição da própria vida. Era a diferença mais significativa entre este mundo e o de Akari e, neste momento, estava flutuando bem na frente de seus olhos.
Uma força que conduz tudo… Como um poder enigmático com tal nome se tornou a base de conjurações “mágicas”?
Akari se perdeu na curiosidade intelectual por um momento. E então algo a atingiu levemente nas costas.
“Bwah?!”
“O que você é, uma criança?”
Uma pequena garota, dois ou três anos mais nova que Akari, lhe deu uma ombrada rude. Ela usava um traje branco de sacerdotisa e bufou quando Akari gritou de surpresa.
Adorável, sem dúvida, seria a primeira palavra a vir à mente ao ver essa garota.
Ela havia encurtado significativamente a saia do seu traje que normalmente chegava até o tornozelo e acrescentado um monte de babados como um extra. Suas pernas graciosas eram protegidas de elementos externos por uma meia calça preta.
“A menos que tenha secretamente dez anos de idade, por favor, não brinque com a Luz Etérea. Se não estiver sendo usada para produzir uma conjuração de algum tipo, ela não tem muita presença física.”
O tom da garota foi afiado ao repreender Akari por seu comportamento imaturo.
Apesar de seus olhos inocentes e estatura baixa, sua atitude era tão abertamente rude que a fazia parecer mais irritante do que amável. Acontece que sua natureza era muito mais agressiva do que qualquer impressão inicial sugeria.
“Momo…”
Akari apenas disse o nome de sua companheira, mas foi o suficiente para fazer os olhos de Momo se estreitarem em aborrecimento.
Embora ela estivesse bem ciente da verdadeira personalidade Momo, ainda era frustrante se deparar com uma irritação tão descarada. Os lábios de Akari se torceram e formaram um beicinho.
Percebendo a raiva da outra garota, Momo olhou diretamente para ela a cerca de meia cabeça abaixo de sua linha de visão.
“Qual é a dessa expressão ridiculamente infantil, hmm? Se tiver alguma reclamação, ficarei feliz em ouvir.”
“Ah, é meeesmo?”
Momo estava obviamente tentando provocá-la, mas Akari também não tinha intenção de esconder sua animosidade. Ela sentou-se num banco, cruzou os braços e aumentou incisivamente sua inflexão no final das frases.
“Qual é o problema? Ainda temos muito tempo antes do nosso próximo trem chegar. Por que não posso ser livre para fazer o que quiser, hein? Além disso, é muito irritante da sua parte implicar com cada coisinha que faço, Momo. Você é o quê? Uma cunhada amargurada? Talvez esteja com ciúmes por eu ser a favorita de Menou?”
“Se importa de guardar suas fantasias para si mesma? Depois de todo meu esforço planejando esta viagem e realizando os preparativos, a última coisa que quero ouvir é choradeira de um estorvo. Se você não pode assumir a responsabilidade por suas próprias ações, obviamente não é livre para fazer o que quiser, sua abestada. Aliás, nem quero falar com você, entendeu?”
“Ah, é meeesmooo?”
O bate-boca esquentou, marcando o início de uma guerra verbal.
Akari e Momo fizeram careta uma para a outra com franca hostilidade, com o ar praticamente estalando de tensão onde seus olhares se cruzavam.
O lado alegre e amigável que Akari mostrava a Menou sumiu de vista quando ela segurou a manga de sua blusa branca ondulante na altura da boca e deu uma risadinha forçada.
“Ah-ha-ha! Ah, querida Momo, você é tão engraçada. Antes de tudo, se não quer falar comigo, por que começou essa conversa? Esquecer suas próprias ações tão rapidamente sugere que talvez seu cérebro seja tão minúsculo quanto seu corpo. Ah, desculpe. Você é sensível sobre ser baixinha, não é?”
“Ora, sua…”
A gestualidade atípica de Akari tornou seu insulto ainda mais mordaz. Ela tocou num ponto sensível. Os lábios de Momo se estreitaram, mas ela não desfez seu sorriso adorável.
Ela se sentou no banco o mais longe possível de Akari, cruzando suas pernas com meia-calça preta. Cruzando olhos com Akari olhando de canto de olho, Momo, sorridente, tocou um lado da cabeça com um dedo coberto por uma luva branca.
“Estou surpresa que um Erro Humano que perde suas memórias toda vez que usa seu poder esteja preocupada com a minha mente. Eu estaria mais preocupada com o seu próprio cérebro… Embora, suponho que você nunca teve muito com o que trabalhar. Talvez sua personalidade fique um pouco mais suportável quando sua mente apagar. Assim, não terei que me preocupar tanto com a minha querida.”
“Hah! Tenho pena de você, minha querida Momo. Esse seu temperamento asqueroso não tem concerto. Não consigo imaginar o quão horrível seria ter que passar a vida inteira com uma mente tão distorcida em sua pobre cabecinha. É estúpido se precupar com Menou sendo que você é quem está causando problemas a ela.”
“Cuidado para não falar da minha querida quando tudo que você tem a seu favor é sua habilidade e esses peitos absurdos, sua imbecilóide inútil.”
“Isso é bom, vindo de uma megerinha astuta como você. Você sabe que Menou não te acha fofa da forma como você realmente é, não sabe? Por isso você sempre finge ser inocente quando fala com ela, né?”
“Perdão? Não quero ouvir isso de uma meretriz de duas-caras que chegaria ao ponto de reverter suas próprias memórias só para continuar agindo como uma donzela em apuros. Sua covarde!”
O choque de palavras parecia duas lâminas se chocando de tão intenso. Um clima turbulento se formou em torno do par, escurecendo a plataforma pacífica. Transeuntes evitavam as duas garotas.
A língua de Momo estava ainda mais afiada do que o de costume, afiada por pura animosidade. Mesmo assim, Akari se recusava a ceder.
“Você é a verdadeira covarde, não acha, Momo? Você conhece Menou desde pequena, mas ainda assim não consegue ter uma conversa natural com ela, a menos que se finja de fofinha… Sua autoconfiança é realmente tão baixa assim?”
“Ah-ha-ha-ha-ha, melhor do que ser uma cabeça oca que não consegue conquistar o coração da minha querida, por mais que repita os mesmo eventos n vezes!”
Um objetivo em comum uniu Momo e Akari, mas elas não eram amigas nem colegas. Chamá-las de inimigas naturais seria um eufemismo. Suas viagens juntas significavam desastres quase constantes.
“Haah. Você tem um leque grande de insultos para alguém tão pequena, Momo.”
“E você deve estocar os seus nessa sua barriga rechonchuda, eu presumo.”
Com isso, um cessar-fogo foi convocado para que ambos os lados pudessem recuperar o fôlego.
Talvez a dupla tenha percebido a futilidade da sua briga? A multidão próxima esperando pelo mesmo trem sentiu uma sensação coletiva de esperança, mas que provou ser passageira. Pouco tempo depois, as garotas começaram a lançar olhares tão afiados quanto adagas uma para a outra novamente, com faíscas voando como um suéter de lã sendo esfregado no ar seco do inverno.
O confronto silencioso não permaneceu assim por muito tempo.
Enquanto a tensão se elevava rapidamente no ar, Akari foi a primeira a dar outro disparo.
Ela começou com um gancho, soltando um suspiro alto e intencional.
“Que coisa. Não se dar bem com sua companheira de viagem estraga qualquer prazer que você possa tirar da jornada, não é, querida Momo?”
“Que coincidência. Eu estava justamente pensando que uma viagem é muito mais desgastante com uma pessoa absolutamente horrível.”
“Pois é, eu entendo totalmente isso! Finalmente, concordamos em alguma coisa!”
Embora o tom de Akari fosse leve, havia calor o suficiente por trás de cada palavra para chamuscar as sobrancelhas de ouvintes próximos. Ela continuou com a conversa alegre, porém inquietante, e de repente abaixou a voz.
“Não é à toa que Menou sempre faz questão de viajar separada de você, Momo.”
Nisso, uma veia saltou na testa de Momo.
O ataque a atingiu bem onde doía. Por um momento, o nível de fúria que ela não conseguia esconder totalmente chegou a um grau completamente assassino. No entanto, mesmo enquanto Momo exalava um ar avassalador de “Vou arrancar a cabeça dela”, ela manteve um sorriso superficial.
A expressão calma de Akari também permaneceu firme, apesar dela estar no lado receptor da intenção assassina de alguém que passou por um treinamento intensivo para se tornar uma Executora assistente.
Devia haver alguma regra implícita que quem parasse de sorrir primeiro seria a perdedora. Isso era uma batalha de orgulho absurdamente sem sentido.
“A única razão para eu viajar separada da minha querida é porque um insetinho nojento se enfiou entre nós, entendeeeu? Tenho certeza que cada segundo que ela passou comigo e longe de você foi como respirar ar fresco para ela.”
“Acha meeesmo? Nunca passou pela sua cabeça que talvez Menou estivesse tentando fugir da stalkerzinha irritante que usa sua posição como assistente para tirar fotos sorrateiras dela? Ou talvez você não tenha ciência do quão horrorosa é sua personalidade, Momo? Você tem que tomar consciência de que está incomodando outras pessoas!”
“Eu diria que você é quem precisa perceber o quão terrível é. Estou certa de que deve ter sido difícil para minha pobre querida viajar com uma mulher tão desagradável e podre.”
Diferente da grandiosa troca de insultos da primeira rodada, o par agora estava usando alguém que não estava presente para esfaquear uma a outra. Se a pessoa em questão pudesse ouvir essa discussão, sem dúvida desenvolveria uma dor de cabeça instantânea com o enorme absurdo.
Mas infelizmente, não havia ninguém aqui agora para mediar entre as duas.
“A propósito, sobre essas chamadas fotos sorrateiras, eu tenho um álbum inteiro da minha querida quando ela era pequena. Gostaria de ver?”
“…?!”
A bola curva repentina deixou Akari em silêncio pela primeira vez desde que a guerra começou.
A escritura de uma sacerdotisa possuía a habilidade de registrar imagens na forma de uma conjuração. Momo fez uso profundo disso, pois era uma das poucas conjurações que ela se destacava, para criar um álbum extenso (e altamente não autorizado) da sua amada Menou desde criança.
Akari também estava ciente disso. Seus olhos dispararam para várias direções, revelando seu conflito interior sobre morder a isca.
Ela queria desesperadamente ver, mas a última coisa que queria fazer era pedir gentilmente a Momo para mostrar a ela. Akari também tinha seu orgulho. E ainda assim… seus sentimentos entraram em conflito e ela gemeu de angústia.
Observando a aflição óbvia de Akari, Momo começou a rir.
“Ah-ha-ha-ha, você é tãããão estúúúpida! Como se eu fosse te mostrar mesmo que pedisse, sua idiooota!”
“Quêêê—!? S-sua…!”
Enquanto Momo ria em uma demonstração de riso que era apropriado para sua idade de certa forma, Akari olhou para ela com um sentimento vingativo. Claramente sentido que tinha a vantagem, Momo balançou a cabeça e adotou um tom de pena.
“Minha coleção da querida é o meu tesouro mais radiante, o resultado de muitos anos de esforço, saaabe? E além disso… Minha querida pessoalmente a apagou um tempinho atrás, então agora não existe mais.”
Recordar disso evidentemente magoou Momo. Repentinamente, ela se inclinou para baixo com peso, cobrindo o rosto com as mãos. Menou a tentou com a recompensa de uma foto de traje de banho e então apagou impiedosamente a coleção inteira com suas próprias mãos.
“E-espera, não existe mais?” Akari parecia igualmente chocada por ter perdido a chance de ver fotos de uma Menou criança.
Aliás, Momo ainda não havia percebido devido a seu sofrimento na ocasião, mas Menou, na verdade, apagou somente as fotos que foram tiradas sem permissão. Ela deixou todas que haviam sido registradas normalmente, por pura bondade de seu coração.
“Certo, mas—ugh.”
Enquanto a dupla tentava se recuperar do seu choque mútuo para retomar a troca de insultos novamente, um sino tocou, indicando a chegada de um trem.
Era o que elas deveriam pegar em seguida, parando na estação com o barulho pesado das rodas. Os sons turbulentos de seu desembarque forçaram a discussão de Momo e Akari a se acalmar.
Ambas ainda estavam lutando contra o arrependimento pelos insultos que ainda não haviam desencadeado. Embora cada garota estivesse com uma expressão que dizia Eu estava só começando, elas não eram tolas a ponto de arriscar perder o trem por causa disso.
“…Ei, Momo. Aquilo que você disse antes de deixarmos o oásis era verdade, não era?” Akari perguntou.
“Claro que era. Não tenho motivo para mentir sobre aquilo. Por que mais eu me daria ao trabalho de trazê-la junto comigo?”
Em vez de brigar, elas falaram sobre seus próximos passos.
Akari se separou de Menou, sua amiga mais preciosa do mundo. Momo, também, levou Akari embora apesar de saber que isso iria aborrecer a pessoa mais querida para ela do que qualquer outra.
As duas garotas se levantaram para embarcar no trem. Havia apenas uma razão para elas estarem deixando Menou para trás.
Para que ela sobrevivesse.
“Enquanto minha querida estiver nos perseguindo, ela nunca trairá a Faust.”
Era por isso que ambas estavam viajando juntas, embora não conseguissem se dar bem nem de longe. Ficar distante de Menou era o objetivo mais importante.
“E você tem certeza que Menou não vai nos alcançar?”
“Mas é claro. Afinal, estamos três dias à frente da minha querida.”
“Três dias?”
“Você achou que eu saí do lado da minha querida sem tomar nenhuma medida preventiva?” Momo claramente não se preocupava em tranquilizar Akari, mas explicou mesmo assim. “Antes de partirmos do oásis, roubei todos os fundos de viagem dela. Ela estará muito ocupada arrecadando dinheiro para vir atrás de nós.”
“…Credo.” Akari pareceu surpresa com seu método insensível. “Você é mesmo uma pessoa horrível, Momo.”
“Claro que sou.” Momo respondeu com frieza. “Não existe uma Executora boa, exceto a minha querida.”
Akari não teve resposta para aquele argumento estranhamente convincente.
*
Com cada rajada de vento, as areias do deserto da Fronteira Selvagem dançavam na atmosfera árida. O sol constantemente queimava a pele neste ambiente hostil.
No centro deste deserto impiedoso, o oásis era uma área crucial de descanso que fornecia água e repouso do cenário intenso. Além de saciar a sede de alguém, a abundante fonte de água cultivava uma vegetação exuberante que era escassa no deserto. Pessoas se reuniram lá e construíram edifícios. Em pouco tempo, se tornou um ponto de parada valioso em qualquer jornada pelo deserto.
Atualmente, uma garota estava em uma pousada nesta cidade, sozinha.
Apesar de estar no meio da adolescência, ela possuía uma beleza madura e estava vestida com a túnica anil que a marcava como uma sacerdotisa oficial. Havia uma abertura generosa no lado direito de sua saia, mas que não estava lá para exibir suas pernas longas e esbeltas; era para que ela pudesse acessar com facilidade a adaga mantida num cinto em torno de sua coxa.
Seu nome era Menou, também conhecida como Flarette, e ela era uma Executora caçadora de tabus da Faust.
Todo o corpo da garota estava brilhando com Luz Etérea fosforescente. Seu espírito nunca oscilava, nem mesmo no intervalo de um único respiro.
Ela extraiu “poder” da sua alma, controlou-o com seu espírito e o circulou por todo seu corpo. Enquanto a Força Etérea estava fluindo em sua carne, ela estagnou e parou anormalmente em algumas áreas. Ela se concentrou em retornar essas áreas problemáticas ao normal, mantendo lentamente a distribuição.
Menou havia sofrido danos consideráveis em lutas recentes.
Primeiro, ela batalhou contra o grupo criminoso armado Corrente de Ferro. Depois Sahara, a freira com o braço artificial. E finalmente, ela combateu a marionete realizadora de desejos que os sonhos de Sahara trouxeram a vida, o soldado conjurado da Tríade Primária.
Ela conseguiu emergir vitoriosa das terríveis batalhas, mas certamente não ilesa.
Os ferimentos do conflito final foram particularmente intensos. Menou se recuperou no último momento de uma derrota muito próxima. Agora a sacerdotisa estava se concentrando em curar suas feridas.
O Aprimoramento Etéreo fortalecia as capacidades físicas do usuário. Ela estava usando-o para se concentrar em aumentar a capacidade de cura do seu corpo, acelerando o processo de fechamento de suas feridas. Esse método podia restaurar ferimentos rapidamente, embora tivesse seus limites.
Passado algum tempo, Menou abriu os olhos velozmente.
A Luz Etérea em torno do seu corpo se dissipou. Com um curto suspiro, ela se levantou e balançou seus membros. Enquanto ela se alongava, seu rabo de cavalo castanho-amarelado balançava junto com o laço preto segurando-o no lugar.
Após uma série de movimentos para verificar se havia alguma dor remanescente, ela determinou que não havia problemas significantes.
“Certo, isso deve bastar.”
Menou não estava de volta em sua força total, mas se recuperou a ponto de se sentir preparada para uma luta. A maior parte dos danos que ela sofreu foram superficiais, que são mais fáceis de tratar. Não seria tão fácil curar se fossem fraturas ósseas, cortes que atingiram órgãos internos ou outros ferimentos mais graves.
“Agora, isso cuida da minha saúde…” Menou pausou e abaixou o tom. “Mas tenho que fazer algo sobre o dinheiro.”
Seus olhos estavam cheios de angústia enquanto ela olhava para a cama, onde estavam todos os seus pertences de viagem.
A bolsa de couro robusta que geralmente pendia de seu cinto estava achatada, carente de seu conteúdo habitual. Ela espalhou tudo que carregava consigo na cama para poder examinar tudo com um olhar objetivo.
Enquanto Menou olhava para os objetos pessoais arrumados ordenadamente, sua expressão azedou ainda mais.
Com tudo à vista, era muito mais aparente. O item mais importante que ela precisava para suas viagens estava faltando.
Em suma, seu dinheiro havia sumido.
“…Por que raios isso aconteceria?”
Menou segurou a carteira vazia entre seus dedos. A natureza de sua tristeza era estranhamente específica: a de alguém muito familiarizado com a ansiedade de viver sem dinheiro.
Ela economizou para pagar pelas despesas de viagem aceitando missões—e em outras ocasiões passando por tribulações ultrajantes—e agora se foi. Menou não gastou tudo em uma farra extravagante de compras. Isso era certo. Na verdade, ela estava acostumada com um estilo de vida frugal e diligente. Ainda no outro dia, ela derrubou o grupo criminoso Corrente de Ferro em seu esconderijo no deserto como parte do seu trabalho para a Faust.
No entanto, enquanto ela estava fora se envolvendo em todo tipo de problema, alguém invadiu seu quarto na pousada e roubou todo o seu dinheiro.
Como sacerdotisa, Menou estava familiarizada com a pobreza honrosa, mas certamente não gostava disso. Tecnicamente, ela era uma elite que se esforçou e subiu na hierarquia do clero; por que ela tinha que sofrer tanto em prol de dinheiro? Seus pensamentos vagavam por essas reflexões escapistas porque dinheiro não era a única coisa que ela havia perdido.
Outra coisa foi levada.
Akari Tokitou, com quem ela esteve viajando todo esse tempo, havia sumido.
Quando Menou foi forçada a enfrentar sua terrível situação novamente, ela murmurou sombriamente para si mesma, “Sinto uma dor de cabeça chegando…”
Isso era um problema ainda maior do que a carteira vazia. De fato, o desaparecimento da garota era tão sério que estar falida era trivial em comparação.
Afinal, a função atual de Menou era viajar com Akari.
Akari Tokitou era uma ovelha perdida evocada de um país chamado Japão em outro mundo e portadora do Puro Conceito Tempo. A tarefa de Menou como Executora era supervisionar e eventualmente lidar com ela. Mas agora, seu alvo havia sumido.
Menou cruzou os braços, se perguntando o que fazer, quando uma voz de repente soou atrás dela.
“Uau, patético é pouco.”
Ela se virou, mas não havia ninguém ali, apenas duas escrituras postas sobre uma mesa. Momo deixou uma para trás, mas a outra era a origem da estranheza.
A escritura pessoal de Menou estava falando com voz humana.
“Qual é a sensação de levar uma rasteira de sua própria assistente?”
“Não seja ridícula, Sahara.”
Assim que Menou falou com frieza o nome da dona da voz, a escritura emitiu uma Luz Etérea que formou uma imagem holográfica.
Uma garota usando um traje de freira apareceu flutuando no ar.
Seu cabelo prateado ondulado descia até um pouco acima dos ombros, enquanto seus olhos meio fechados lhe davam uma expressão permanentemente apática. Ela era, sem dúvida, uma linda jovem, mas sua característica mais chamativa, definitivamente, era o seu tamanho.
Ela era pequena o suficiente para caber na palma de uma mão.
Embora ela originalmente pertencesse à igreja, a garota portava ciúme e inveja de Menou que a levou a usar tabus. Ela perdeu seu corpo após uma luta com Menou, porém de alguma forma, seu espírito acabou dentro da escritura de Menou em uma estranha ironia do destino.
Deprimida com a terrível surpresa, Sahara passou um tempo enrolada como uma bola murmurando “Eu quero morrer” repetidamente, mas ela começou a ficar mais animada ao ver o que Momo fez com Menou.
“Momo levou a pobre Akari embora. Sua confiável assistente te traiu, Menou.”
“…Ainda não sabemos com certeza se Momo é a responsável.”
“Aham, certo. Eu sei que você tem plena consciência de que é a possibilidade mais provável.”
“……”
Menou ficou em silêncio, abatida.
Sahara estava correta. Os sinais de que Momo havia fugido com Akari por livre e espontânea vontade eram dolorosamente aparentes. A tiara de Akari e a escritura de Momo haviam sido deixadas para trás. Acrescente o bilhete e não havia dúvida de que as duas garotas escolheram partir. Menou sugeriu o contrário apenas para cobrir sua amiga.
“O que vai fazer? Essa decisão não faz sentido nenhum para a assistente de uma Executora. Na minha opinião, você obviamente tem que denunciar aquela aberraçãozinha violenta como traidora da causa, sabe?”
“Não vou fazer isso. Estou certa de que ela tem um bom motivo para suas ações. Além disso, ela é minha assistente. Tenho que assumir a responsabilidade por ela.”
“…Ugh. É tão típico de você ser mole com a Momo; me dá arrepios.”
Menou ignorou friamente o gancho de Sahara. “Que pena. Este desenvolvimento significa que terei que lidar com você depois.”
O ato de Momo não podia ser ignorado. Portanto, por enquanto, eliminar Sahara como uma freira que cometeu graves tabus teria que esperar.
Menou bateu levemente na escritura com os nós dos dedos.
“Sahara. Agora, você é um tabu. Sinto muito, mas não tenho como salvá-la. Talvez você devesse ser grata a Momo por estender seu tempo de vida?”
Dessa vez, foi Sahara que ficou em silêncio com o comentário sarcástico.
Mesmo que a Sociedade Mecânica tivesse influenciado ela, suas ações foram imperdoáveis.
Além de tentar matar Menou, ela se fundiu com a escritura dela devido a assumir as características da Sociedade Mecânica. A própria existência de Sahara agora era um tabu.
Ela se transformou de humana em uma forma de vida de Força Etérea.
Perder o corpo mantendo a alma e o espírito preservados era um fenômeno raro. Uma vez que Menou alcançasse Momo e a contivesse, ela também teria que cuidar dessa situação com Sahara. Ela pretendia oferecer a escritura contendo Sahara como prova quando relatasse o incidente.
“Eu estava planejando entregá-la para a igreja na próxima cidade, mas não tenho tempo para isso agora. Assim que eu reaver Momo, só terei que carregar você comigo todo o caminho até a terra santa.”
Para chegar ao seu destino e à Espada de Sal, Menou teria que cruzar a terra santa, a localização central da Faust. Fazer essa viagem havia se tornado uma necessidade desde o momento em que ela escolheu a Espada de Sal como meio para matar Akari, que não podia ser morta por métodos normais.
“O que quer que elas façam com você depois disso não é da minha conta… Imagino que queira se preparar para o pior.”
Menou só se absteve de queimar sua escritura para se livrar de Sahara porque ela não entendia de fato o que exatamente a ex-freira havia se tornado.
Tudo que ela sabia era que a presença de Sahara na escritura atrapalhava a habilidade de Menou de usar conjurações. Por ora, ela teria que pegar emprestado a que Momo deixou para trás.
“Precisarei que você fique fora de vista até lá. Nada de assumir uma forma visível com Luz Etérea, obviamente—e tente não falar nada também.”
“…E se eu recusar?”
“Então talvez eu tenha que considerar destruí-la na hora.”
Era raro um humano se transformar em uma forma de vida de Força Etérea, mas não completamente inédito. Ainda assim, era desconcertante que Sahara, de alguma forma, existisse dentro da escritura de Menou.
Uma das razões principais para Menou não queimar o livro imediatamente era que não havia como saber se isso iria, ou não, piorar a situação. Poderia até mesmo fazer a marionete realizadora de desejos aparecer novamente.
Esse cenário parecia altamente improvável, no entanto.
Na verdade, uma pequena simpatia por Sahara e relutância em matá-la uma segunda vez também ajudaram a segurar a mão de Menou.
“…Entendo.”
Sahara pareceu não se abalar com essa ameaça de execução.
“Faça o que quiser. Não pretendo ajudá-la e certamente não quero que me ajude também. Eu sou uma ex-freira que cometeu um tabu. Você é uma sacerdotisa Executora que se livra de pessoas como eu. Ponto final.”
“…Verdade.”
Se era assim que Sahara se sentia, não havia mais nada que Menou pudesse fazer. No máximo, ela poderia oferecer-lhe alguém para conversar e mesmo isso seria apenas pelo pouco tempo até que Sahara sumisse para sempre.
“De qualquer forma, eu ainda tenho que ir atrás de Momo primeiro. Afinal, preciso saber o que ela estava pensando quando levou Akari embora.”
“Como? Você não parece estar exatamente em ótima forma para alcançar alguém no momento.”
Sahara olhou para a carteira vazia de Menou e sorriu.
“Digo, você não tem dinheiro, certo?”
“Não, suponho que não…”
Ela estava absolutamente certa. Este problema fundamental tinha que ser resolvido antes que Menou pudesse tomar qualquer outra medida.
Claro, ela não estava sem planos para lidar com isso. Menou se ajoelhou e enfiou uma mão em uma de suas botas que subiam até a panturrilha.
O farfalhar de papel-moeda roçou na ponta dos dedos. Ela agarrou e puxou uma nota de dez mil in.
“…Acho que você não está totalmente quebrada, então.”
“Naturalmente. Eu já viajo há muito tempo, você sabe.”
Sahara parecia desapontada, mas Menou ignorou isso.
A sacerdotisa não era tola o suficiente para colocar todo o seu dinheiro em uma pequena carteira. Ela ainda tinha a pequena quantia que havia separado e escondido consigo. Não era muito, mas deveria ser o suficiente para comprar comida e água para atravessar o deserto.
“Mas ainda não é o bastante.”
Sahara estava certa novamente.
Se Menou cruzasse o deserto com tão pouco, ela ficaria sem nada quando chegasse à divisa. Se Momo esperava escapar da perseguição, ela provavelmente pegaria um trem, e se Menou aceitasse um trabalho para arrecadar fundos de viagem, ela perderia a chance de alcançar Momo e Akari.
Geralmente, quando Executoras como Menou precisavam pedir dinheiro para suas missões, elas eram incubidas de resolver dificuldades locais. Por serem forasteiras para a paróquia, aceitava-se que teriam de trabalhar para ganhar o seu orçamento.
Mesmo que Menou conseguisse chegar à próxima cidade, não havia garantia de que a igreja lá iria simplesmente dar o capital que ela precisava. Ela definitivamente perderia o rastro de Momo e Akari se perdesse tempo extra negociando.
Menou bateu a cédula contra o queixo, pensativa.
Qual foi o motivo de Momo levar Akari embora?
Ela raptou Akari enquanto Menou estava lutando contra a Corrente de Ferro e até chegou ao ponto de roubar o dinheiro de Menou para retardar sua perseguição. A mudança repentina de eventos foi como um raio em um céu azul para a Executora.
Menou e Momo eram muito íntimas. Elas se conheciam desde a infância no monastério. Certamente, a proximidade que elas construíram ao longo dos anos não estava apenas na mente de Menou.
Então por que Momo iria contra as ordens de Menou e levaria Akari embora?
Menou procurou em sua memória por quaisquer momentos que pudessem explicar o comportamento e os encontrou.
“Como a missão envolve ficar com o alvo por um extenso período, por favor, deixe-me cuidar disso eu mesma… Não acho que essa missão… lhe seja adequada, querida.”
“…Mas não é bem com isso que estou preocupaaada.”
A conversa foi de quando Menou assumiu a jornada com Akari: no Reino de Grisarika, quando ela se deu conta do seu papel pela primeira vez. Na época, Momo duvidava que Menou fosse adequada para o trabalho.
Dois meses se passaram desde então.
“…Então era assim que Momo enxergava as coisas.” Menou sussurrou para si mesma, tão silenciosamente que nem Sahara pôde ouvi-la.
Ela entendeu vagamente por que Momo tomou uma decisão não autorizada, mas isso só a fez franzir ainda mais.
Momo era excepcionalmente habilidosa. No entanto, seu processo de pensamento podia ser um pouco egocêntrico, provavelmente porque ela poderia resolver a maioria dos problemas simplesmente contando com sua força pura e capacidade. Sua abordagem fundamental era corrigir problemas da maneira que ela considerasse adequada. A garota raramente considerava métodos que ela não pensava naturalmente.
Consequentemente, isso a tornava fácil de prever.
Seu trabalho no âmbito era incrível, mas ela era implicante demais quando formava planos. Embora Momo seguisse obedientemente as ordens de Menou quando estava sob sua supervisão direta, o fato de ela ter dificuldade em aderir a esses comandos em qualquer outra circunstância era a razão pela qual ela permanecia como assistente.
Era fácil adivinhar por que ela roubou o dinheiro da viagem. Era para atrasar Menou, pura e simplesmente.
Ao viajar com alguém tão inexperiente quanto Akari, naturalmente levava muito mais tempo para ir de um lugar para outro. Momo tinha que ganhar tempo para evitar que Menou a alcançasse.
No entanto, havia uma maneira fácil de contornar isso.
“Acho que nunca passaria pela cabeça de Momo que eu poderia pedir ajuda àquela pessoa.”
“Que pessoa?”
Sahara não sabia a quem Menou estava se referindo.
“Acontece que conheço alguém com bolsos fundos, sabe?”
*
“Dinheiro? Mas é claro.”
A pessoa a quem Menou solicitou fundos de viagem concordou prontamente antes mesmo de um número ser mencionado.
Essa figura generosa também era deslumbrante. Ela era bem alta para uma mulher, dotada com todas as curvas certas e usando um vestido notavelmente provocativo que acentuava todas elas. Mesmo sem nenhuma ornamentação, ela já era surpreendentemente linda. Poucas pessoas podiam ostentar uma criação nobre, características naturais e personalidade que combinavam tão bem.
Seu nome era Ashuna Grisarika, a poderosa jovem Princesa Cavaleira do Reino de Grisarika.
Ela lutou ao lado de Menou durante a operação para destruir o grupo criminoso Corrente de Ferro. Ashuna sofreu uma quantidade considerável de dano na luta, mas não havia cicatrizes visíveis nela agora. Muito provavelmente, ela usou Aprimoramento Etéreo para acelerar sua cura, assim como Menou.
“Tem certeza? Eu ainda nem disse de quanto preciso.”
“Isso não importa.”
Ashuna cruzou as pernas e sorriu elegantemente, com seus olhos azuis brilhando.
“Se emprestar-lhe dinheiro irá colocá-la em dívida comigo, não poderia pedir por mais nada. Vá em frente, dê-me um número. Quanto mais dígitos, melhor. Idealmente, uma quantia que você nunca conseguiria pagar de volta.”
“…Prefiro pedir o mínimo absoluto necessário, muito obrigada. Irei ressarci-la assim que possível.”
“Sério? Bom, é uma pena.”
Ashuna parecia genuinamente desapontada. Ela não aceitou emprestar porque se importava pouco com sua fortuna, mas porque sabia que Menou era um investimento garantido de render um bom retorno. A dívida seria saldada pela própria Ashuna cobrando Menou, e essa ânsia claramente deixou a sacerdotisa visivelmente desconfortável.
Ashuna não parecia particularmente aborrecida com isso. Ela apenas jogou sua carteira casualmente para Menou.
“Aqui, leve o quanto quiser.”
“…Obrigada.”
Menou estava bem ciente da personalidade galante de Ashuna e que era melhor não protestar. Portanto, ela simplesmente pegou algumas notas de dez mil in da carteira na hora.
“Se tudo que precisa é um valor tão trivial que pode ser contido em uma carteira, simplesmente pegar emprestado e devolvê-lo proporcionaria pouco entretenimento. Esta é uma rara oportunidade. Talvez eu deva atribuir algumas condições?”
“Eu não estava pedindo dinheiro para o seu entretenimento, mas… tudo bem. Vai exigir juros ou algo assim?”
“Juros? Onde está a graça nisso?”
Cobrar juros era uma tática padrão para emprestar dinheiro. Enquanto a sempre parcimoniosa Menou se preocupava se seria muito excessivo, um sorriso malicioso se espalhou pelo rosto de Ashuna ao aceitar a carteira de volta.
“Hrm, então você pegou só uns cinquenta mil in? Neste caso, não precisa me ressarcir. Em vez disso, farei você fazer algo divertido para mim.”
Apesar de ouvir que não teria que pagar o dinheiro de volta, os receios de Menou apenas dobraram.
Ela observou e ouviu com temor crescente enquanto Ashuna se levantava.
“Como você deve saber, eu tenho um apreço por roupas.”
“Sim, bom, suponho que isso faz sentido.”
O vestido que Ashuna geralmente usava possuía um design único e inovador. Era fácil deduzir que ela era exigente em relação à moda.
Mas o que isso tinha a ver com seus termos para emprestar dinheiro? Enquanto Menou se esforçava para enxergar a conexão, Ashuna caminhou até um armário num canto do quarto.
O armário estava cheio de todos os tipos de vestimentas.
O vestido de Ashuna era de fato notável, mas os outros conjuntos em seu guarda-roupa também falavam de seu gosto por elegância. Ashuna escolheu um com um sorriso voraz.
“Aqui está, Menou. Peço-lhe que use isto por um tempo. Ah, não se preocupe, irei solicitar a minha alfaiate para ajustá-lo ao seu tamanho.”
“…Perdão? A senhorita quer que eu vista isso?”
Olhando para a roupa que lhe foi dada, Menou não conseguiu evitar que uma rara expressão de estupefação cruzasse seu rosto.
*
Poucos territórios neste continente tinham uma população e uma região grande o suficiente para serem chamados de nação.
O ambiente tornava a sobrevivência consistente difícil para a humanidade devido a monstros perigosos, soldados conjurados poderosos, e acima de tudo, as sequelas dos Erros Humanos. Como toda nação era cercada em suas divisas pela Fronteira Selvagem, a maioria dos habitantes deste mundo nunca nem consideraria viajar de um país para outro.
Se alguma vez houve um motivo para cidadãos comuns considerarem se aventurar por essas regiões perigosas, foi para fazer uma peregrinação à terra santa no Oeste do continente. Como havia muito risco envolvido em atravessar a Fronteira Selvagem, a maioria das pessoas só tentaria a jornada uma vez na vida, se tentasse.
Por isso que a maioria dos humanos neste mundo se refere apenas a se mover dentro de sua terra natal quando falam em viajar.
Os trens Etéreos eram indispensáveis para o transporte em qualquer região que fosse, pelo menos, relativamente segura. Os trilhos foram estabelecidos em todos os países, tornando-os a forma de viagem mais popular da humanidade.
A locomotiva que cruzava as planícies além do deserto no centro do continente e em direção a região montanhosa, também era usada para viagens domésticas.
Seu design interior era simplista. Havia um corredor no meio de cada vagão, com assentos alinhados dos lados esquerdo e direito. As cadeiras revestidas com tecido vermelho pareciam confortáveis, mas na realidade, faziam muito pouco para proteger os passageiros de sentir a estrutura do trem. Como elas foram projetadas com apenas aparência em mente e sem acolchoamento real, sentar nelas por muito tempo significava que a pessoa sentiria o tremor do trem o bastante para deixar seu traseiro dolorido. Os assentos eram infames por seu desconforto.
Momo e Akari estavam em duas dessas cadeiras, conversando sobre Menou para passar o tempo.
“Eu sei que Menou sempre veste seu traje de sacerdotisa, mas ela fica ótima em qualquer coisa, não acha? É incrível como ela consegue ser tão maneira, mas ainda assim combinar com roupas fofas. Ainda me lembro daquela roupa de empregada que ela estava usando quando nos conhecemos. Era cheio de babados, porém simples e adorável! …Você já viu Menou vestida assim, Momo?”
“Está falando daquela do Reino de Grisarika? Obviamente que siiim. Fui eu que criei aquele traje de empregada, saaabe!? Muitíssimo obrigada pelo elogio, sua trooouxa!”
“Quêêê!? Você sabe fazer coisas assim? Droga, eu não tenho essas habilidades…”
“Mas é claaaro. Venho registrando o crescimento e a moda da minha querida desde quando éramos pequenas e não poupo esforços por ela. Ao contrário de uma certa pessoa que provavelmente não consegue nem cozinhar, ou costurar, ou invadir e vasculhar um lugar, ou eliminar um capanguinha em batalha, hmmm?”
“Grrrr…!”
Uma era uma sacerdotisa assistente criada em um monastério na terra santa; a outra era uma perdida de outro mundo. Com duas personalidades e conjuntos de experiências vastamente diferentes, a dupla não tinha mais nada em comum para discutir, exceto Menou. E, por acaso, Menou era o assunto que mais interessava a ambas.
Embora relutassem em reconhecer, o par tinha muito o que conversar quando se tratava de Menou.
“Falando na moda de Menou, você mencionou antes de embarcarmos no trem que seus registros foram deletados… Mas tem certeza de que todos foram apagados? As escrituras podem registrar fotos e coisas assim, certo? Menou é muito gentil no fundo, então duvido que ela apagaria todas as suas memórias preciosas. Isso significa que ainda tenho uma chance de ver a Menou criança! Estou errada?”
“Agora que mencionou, suponho que algumas das fotos usuais ainda possam estar intactas… mas deixei minha escritura com a minha querida. Então de qualquer forma, não tenho nada para lhe mostrar.”
“Aw, fala sério. Espera, por que você deixou sua escritura com ela, para começar? Aquela coisa não é uma arma?”
“Raramente uso minha escritura em batalha. Além disso, escrituras que estão conectadas para comunicação também podem localizar umas às outras se estiverem próximas o suficiente. A querida poderia usar isso para nos encontrar, então tive que deixá-la para trás.”
“Hmph. Obrigada por nada, Momo!”
“Fecha o bico, sua garota inútil.” Parecendo satisfeita com a vantagem boba de ser a única que conhecia Menou quando criança, Momo cruzou os braços presunçosamente e mudou de assunto. “Agora, já que temos tempo disponível, vamos conversar sobre outra coisa.”
“Ah paaara, o que poderia ser mais importante do que as fotos de Menou quando criança?”
“Desista. Mesmo que eu tivesse minha escritura, nunca mostraria elas a você. Mudando de assunto, está bem? Tenho perguntas sobre suas memórias.”
Alguns outros passageiros estavam a bordo do mesmo vagão que as duas jovens. Momo olhou em volta para confirmar que elas não tinham ouvintes indesejados e manteve sua voz baixa o suficiente para se perder em meio aos sons do trem em movimento, enquanto trazia à tona o assunto que elas discutiam quase com a mesma frequência que insultavam uma à outra.
“Você usou sua conjuração de Puro Conceito para Regredir o tempo para o mundo inteiro, com a morte da minha querida como o gatilho. Isto está correto, não é?”
“Uhum.”
Akari Tokitou tinha o Puro Conceito Tempo vinculado a sua alma.
Como o nome sugeria, Puros Conceitos eram conjurações sobre-humanas que permitiam ao usuário controlar todo um conceito. Haviam muitas outras variantes além do Tempo de Akari.
As pessoas deste mundo, às vezes, evocavam Ádvenas em busca deste incrível poder, embora ocasionalmente, eles também vinhessem naturalmente.
Era a função de Executoras como Momo e Menou matar tais tabus, mas dessa vez, as circunstâncias eram diferentes.
“E você disse que voltou no tempo várias e várias vezes à procura de uma maneira de salvar minha querida de morrer na jornada até a Espada de Sal, certo?”
Akari assentiu silenciosamente, mas atentamente.
Momo recostou-se no assento. Parecia macio aos olhos, mas isso era firmemente limitado a sua aparência. Com pouco mais do que uma fina camada de pano enrolada em madeira dura, os assentos transmitiam diretamente cada chocalho do trem a qualquer um que tivesse a infelicidade de estar sentado neles.
Enquanto a locomotiva balançava, Momo recompôs seus pensamentos.
Regredir o tempo para o mundo inteiro.
Era difícil imaginar como esse fenômeno funcionava. O efeito era massivo e não havia registros de algo semelhante. Momo também não tinha como observar o que acontecia com a linha do tempo quando era regredida, o que significa que não adiantava muito teorizar sobre isso.
Só uma coisa era certa—a Regressão sempre funcionava a favor de Akari.
Era ela quem tinha o Puro Conceito, a pessoa de fato usando-o. A ocorrência resultante estava fadada a obedecer a sua vontade.
“Você é realmente uma absoluta pedra no meu sapato. Toda a sua existência é inacreditavelmente inconveniente.”
“O mesmo vale para você. Aliás, eu só estou presa voltando no tempo porque você nunca consegue proteger Menou, entendeu?”
“Queixar-se de uma versão minha de um tempo que nunca vivenciei não significa nada para mim, idiota.”
Até Momo ouvir o lado de Akari da história, ela estava agindo exclusivamente para apoiar Menou, apoiando totalmente sua decisão de usar a Espada de Sal para matar Akari.
Porém, assim que ela soube que Menou traiu a Faust para proteger Akari em uma linha do tempo anterior, o objetivo de Momo mudou.
Mesmo antes disso, ela tinha suas preocupações.
Menou era uma Executora incrivelmente habilidosa. Ela sempre matava seus alvos após um período conciso de interação. Seus métodos ecoavam os de Flare, aquela que havia ensinado a ela e a Momo. De fato, Menou agora era conhecida como Flarette em certos círculos do submundo.
Mas porque Menou era tão habilidosa, ela assassinava invariavelmente seus alvos logo após fazer contato com eles. Antes de Akari, ela nunca havia conhecido suas vítimas por muito tempo.
Portanto, Momo não foi pega totalmente de surpresa ao descobrir o que poderia levar à morte de Menou.
“A querida… é gentil demais.”
“Uhum.” Akari assentiu. “Ela tem sido assim desde que a conheci. Menou é muito gentil, pelo menos comigo… Hee-hee!”
“Se ao menos ela pudesse abandonar uma imbecil como vocêêê…!”
Enquanto Akari dava risadinhas, Momo rangeu os dentes, se perguntando por que Menou arriscaria tudo para proteger essa pessoa horrível.
A traição de Menou a Faust significava que ela seria morta por sua Mestra, Flare. E se essa fosse uma possibilidade real, Momo decidiu que não havia necessidade de sua querida matar Akari. Ela simplesmente levou Akari para longe de Menou para que o Erro Humano não a inspirasse a fazer alguma tolice.
Momo mudou seu objetivo de uma jornada para tirar a vida de Akari para uma para salvar a vida de Menou.
“Mas, Momo, Menou vai mesmo ficar bem sem nós?”
Se a proximidade de Menou e Akari era o que desencadeava o desastre, então Menou sobreviveria desde que Akari ficasse longe. No entanto, Akari ficou com a sacerdotisa, argumentando que não havia garantia de que Flare fosse quem realmente tiraria a vida de Menou.
Akari tentou nunca conhecer Menou, mas isso resultou em sua morte ainda mais cedo.
Momo revirou os olhos para expressar que as preocupações de Akari eram desnecessárias.
“Ela vai ficar bem. Escute, você pode não ter percebido isso por conta do quão dolorosamente estúpida você é…”
“Momo, você poderia fechar a matraca em vez de me insultar de novo?”
“Você pode não ter percebido por ser tão densa…”
Momo ignorou completamente o pedido amuado de Akari, enfatizando a estupidez da outra garota enquanto continuava.
“Mas pelo que você me disse, parece que há duas causas principais para a morte da minha querida. Uma, ela é morta pela sacerdotisa de cabelo vermelho que você mencionou—Mestra Flare. Isso acontece quando minha querida se rebela contra a Faust. E a outra… Quando você não está por perto, ela não tem a força para sobreviver a certas lutas perigosas. Imagino que seja principalmente quando ela é capturada pela Arcebispa Orwell no Reino de Grisarika.”
Isso ficou claro quando Akari decidiu evitar o encontro com Menou.
Arcebispa Orwell—uma integrante da Faust que manchou as mãos com um tabu extremo. Ela foi uma oponente poderosa. Individualmente, ela superava Menou de longe e também mantinha estrategicamente o disfarce de uma integrante do clero.
Menou só sobreviveu ao seu reduto na antiga capital de Garm porque conseguiu extrair o Puro Conceito de Akari. Orwell era tão poderosa que nem mesmo Menou poderia derrotá-la com uma fonte de força secreta.
Como Momo ajudou naquela investigação, ela estava muito ciente de que a ausência de Akari tornaria impossível para Menou derrotar Orwell.
“Como havia duas maneiras de minha querida morrer, você escolheu tentar salvá-la viajando com ela, correto?”
“Sim.”
Akari assentiu novamente.
Sem Akari, Menou não teria escapado da armadilha de Orwell. Isso era essencialmente um fato confirmado. Não importa o quão hábil Menou fosse, ela era peixe pequeno para uma inimiga que estava no topo da Faust.
“Desta vez, já vencemos esse desafio. Portanto, o que precisamos nos preocupar agora é a possibilidade de minha querida ser morta pela nossa professora após cruzar o centro do continente.”
Em outras palavras, quando ela deixasse o Deserto de Balar: os eventos que estavam acontecendo neste momento.
Akari havia explicado o loop durante seu tempo no oásis a Momo. Nas viagens de ambas desde então, Momo aprendeu praticamente tudo o que Akari lembrava.
Pelo que ela entendeu, as coisas se diferiam da situação com Orwell quando elas entravam na parte oeste do continente. Mestra Flare só matava Menou quando ela passava mais do que um certo tempo com Akari.
“Mas muito provavelmente, minha querida…”
Momo pausou. Ela não queria expressar o por que Menou trairia a Faust, especialmente na frente de Akari. Ela podia imaginar a outra garota ficando presunçosa com tudo isso muito rapidamente. Se Momo falasse isso em voz alta, ela iria se arrepender. No entanto, ela relutantemente abriu a boca mesmo assim.
“…Imagino que a amizade dela com você vai roubar a vontade dela de tirar sua vida.”
Até onde Momo sabia, Menou morria para Mestra Flare quando traia a Faust para salvar Akari.
Assim que a Executora assistente admitiu isso, um sorriso sem vergonha se espalhou pelo rosto de Akari.
“Ah, é? Heh-heh… Você também acha? Sério? Eu sabia! Menou deve mesmo, mesmo gostar de m—”
“É tudo culpa sua, então morraaaa!”
“Bwuh?!”
Sua reação foi ainda mais irritante do que Momo esperava.
Momo deu um gancho de direita em Akari como se para puni-la pelo pecado de ficar muito cheia de si. Foi um movimento muito exagerado e óbvio, então Akari deslizou rapidamente do seu assento e evitou por pouco que o punho de Momo colidisse com seu rosto.
“Essa passou perto! O que raios deu em você!?”
“Aah, sinto muuuito. Você ficou tão ridiculamente feliz apesar de ser a raíz do problema e não pude controlar meu desejo de te destruiiir.”
“Você está com ciúmes! Não fique furiosa só porque Menou obviamente se preocupa mais comigo do que com você!”
“Peeeerdããão!? Atééé pareeeece! Quem você pensa que éééé!?”
Momo fitou Akari, mas abaixou seu punho. Mesmo que ela desse um soco na cabeça da outra garota, a Regressão simplesmente a traria de volta. Não seria fatal.
“Bom, certamente tenho muitas dúvidas. Mas essa hipótese serve por enquanto.”
Entre as mais imediatas das muitas estranhezas que se destacavam para Momo estava o fato de Mestra Flare, que supostamente iria matar Menou, não ser uma Executora ativa atualmente.
Flare era conhecida como uma lenda viva, mas no momento, sua função era supervisionar um monastério que treinava futuras Executoras. Por mais reverenciada que fosse, ela normalmente nunca seria enviada para uma missão em sua posição.
Por que a Mestra delas sairia de sua aposentadoria das linhas de frente, mesmo para executar Menou por traição?
Menou era incrivelmente habilidosa, mas não era tão forte a ponto de ninguém além de sua Mestra poder matá-la. Mesmo o julgamento tendencioso de Momo tinha que admitir que um esquadrão de sacerdotisas suficientemente habilidosas da terra santa poderiam, muito provavelmente, derrotar Menou.
Embora Flare tenha feito de Menou sua sucessora, ela não era uma pessoa tão sentimental a ponto de insistir ser aquela que iria eliminar sua antiga pupila.
Insensível e implacável.
Uma assassina sem emoções.
Tal era a impressão de Momo sobre sua Mestra. Flare nunca deixou nenhum sentimento afetar sua missão. Ela nem dava tanto valor à própria vida. Então, por que ela faria algo assim?
Contudo, com base no que Akari descreveu de seus múltiplos encontros com sua Mestra, não era coincidência. Durante a primeira vez em particular, não havia dúvida de que Menou traiu a Faust para salvar Akari.
Elas não tinham peças o suficiente para montar o quebra-cabeça, no entanto. Portanto, Momo deixou de lado a especulação sem sentido e passou para o próximo assunto.
“Então a maior diferença entre esta vez e todas as outras é Pandæmônio, certo?”
“Sim, com certeza. Aquilo foi um choque.”
Pandæmônio foi o Erro Humano que elas encontraram na cidade portuária de Libelle. Conhecida como a pior e mais terrível dos Erros Humanos, ela foi selada em um nevoeiro, até um buraco inesperadamente se formar na barreira. Acreditava-se ter sido causado por mil anos de deterioração, mas como se constatou, a Regressão repetida da linha do tempo de Akari foi a causa real.
Momo não pôde deixar de fazer careta para isso.
“Sério, mas que coisa horrível de causar para todas nós. Está tentando destruir o mundo indiretamente?”
“Não, foi sem querer…”
Akari fez beicinho, claramente infeliz com a situação.
Ela genuinamente não sabia que suas conjurações poderiam, potencialmente, libertar um dos Quatro Principais Erros Humanos.
“Embora, digo… Se Menou vai morrer de qualquer forma, quem se importa se o mundo for destruído?” Akari disse.
“Sei o que quer dizer.” Momo concordou com uma expressão perfeitamente séria.
Menou era muito mais querida por ambas do que qualquer outra coisa.
“Não posso culpá-la por estar disposta a aniquilar o mundo para salvar minha querida. Mas se colocá-la em perigo no processo, aí é outra história. Não me importo com o que Pandæmônio faz quando minha querida não está por perto, mas e se elas acabarem no mesmo lugar?”
“Argh, tem razão…!”
A dupla de extremistas amantes de Menou continuou sua discussão sem se importar com quaisquer outras vítimas.
“De qualquer forma, há diversas maneiras de garantir a segurança da minha querida. A primeira e principal é a sua morte. Se uma Ádvena como você morre, não é como se você tivesse família que reclamaria. E o quanto antes você perecer, mais rápido a razão da minha querida para trair a Faust desaparecerá. Infelizmente, ainda vamos ficar com o mindinho de Pandæmônio, mas isso não é tão ruim, presumindo que não haverá nenhum outro dano.”
“…Escute, Momo.” Akari parecia séria enquanto considerava a observação franca da outra garota. “Eu te odeio, então não quero que seja você a me matar. Na minha opinião, há um nível de confiança necessário para abrir mão de sua vida para outra pessoa.”
“O que raios você está dizendo?”
Era, de fato, um senso de valores bizarro.
Claramente, essa garota ficou completamente louca no processo de retroceder o tempo várias e várias vezes. Momo olhou para ela com uma expressão que beirava a pena de uma figura patética.
“Não posso te matar de qualquer maneira, o que torna esse plano discutível.”
“Por que exatamente você não pode, a propósito? Até você deve ser capaz de me eliminar com a Espada de Sal, não?”
“Receio que eu não conseguiria obter permissão para usá-la. Pelo que me disseram, é preciso passar pela terra santa para chegar onde a Espada de Sal é mantida. Como sou uma assistente fugindo da minha própria superior no momento, ir à terra santa seria o mesmo que me render.”
“Aaah, entendo.” Akari assentiu pensativamente. “Então você realmente não pode me matar. Estou meio aliviada.”
“Se eu pudesse, já o teria feito… Pestinha metida.”
“Oh-ho-hooo? Bom, já que você não pode, acho que isso só faz de você um pesticida bem barato, né? Paus e pedras podem quebrar meus ossos, mas pelo menos Momo não pode me ferir!”
Era verdade que Momo não possuía meios de matar Akari. Se a ovelha perdida morresse por qualquer meio normal, o Puro Conceito de Tempo a traria de volta.
“Em todo o caso, concordamos que o motivo para a morte da minha querida é diferente da primeira parte da jornada para os estágios intermediários e além, correto?”
“Correto.”
“Que bom. Então depois que ela cruzar o Deserto de Balar, minha querida não se envolverá em nenhum incidente com o qual não possa lidar, mesmo sem você lá. Portanto, por favor, enfia logo essa ideia na sua cabeça dura.”
“…Entendi.”
Sob circunstâncias normais, Menou não deveria enfrentar problemas graves, como a arcebispa recorrendo a tabus, com muita frequência.
“Você nunca fez um teste para ver se poderia sair do lado dela em algum momento sem que ela morresse?”
“…Eu tinha medo, tá?” A voz de Akari estremeceu. “Acho que foi na terceira vez… que Menou morreu enquanto eu não estava. Então pensei que seria melhor se eu ficasse com ela para sempre para garantir que ela não morresse.”
Essa foi a razão principal pela qual Akari nunca saiu do lado de Menou.
A pessoa que ela estava tentando salvar pereceu em algum evento totalmente não relacionado, muito longe dela, e isso machucou Akari profundamente.
“Mesmo que Menou morra, eu posso voltar no tempo. Começar de novo. Mas se eu nem souber que ela está morta, não posso retroceder o tempo. Não saber o que está acontecendo com ela é insuportável.”
Após repetir as coisas algumas vezes, Akari uma vez tentou escapar do castelo em Grisarika antes de ser resgatada—fazendo com que ela nunca conhecesse Menou.
No final das contas, ela vagou sem rumo sozinha até que foi pega por Flare e soube da morte de Menou. Até então, ela presumiu que Menou estava viva e não foi capaz de usar a conjuração que rebobinava o tempo para o mundo inteiro.
Akari sempre foi muito mais emocional do que lógica por natureza. Seu desejo obsessivo de estar com Menou tornou impossível analisar a situação objetivamente.
Momo cruzou os braços enquanto escutava a confissão de Akari.
Para seu próprio aborrecimento, ela entendia exatamente como a outra garota se sentia. Ela não pôde evitar simpatizar com o sentimento de colocar a vida de Menou acima de tudo.
“Bom, temos muito trabalho pela frente. Espero que esteja preparada.”
“Eu sei, mas ainda assim, Momo…” Akari suspirou. “Meu coração simplesmente não está nisso, me refiro a viajar com você. Não há entusiasmo em compartilhar coisas juntas, nenhuma emoção. Uma jornada em outro mundo deveria ser divertida, sabe?”
“Entusiasmo, hmm?”
Momo estreitou os olhos. Se Akari já viveu a mesma viagem múltiplas vezes, ela sem dúvida estava acostumada com a mesma a essa altura. Certamente, ela só estava reclamando para arranjar briga.
Momo não era de recusar tal oferta, no entanto.
“Bom, esta é a sua primeira vez vindo a essas montanhas, não é?”
“Hã? É, acho que sim.”
“Entendo. Você só pegou os trens em planícies antes, imagino. Se minha querida levasse você até a Espada de Sal, ela iria pelo caminho da terra santa em vez de fazer um desvio como este. Neste caso…”
Momo virou sua atenção para o que estava além da janela. Desde que o trem entrou nessa região montanhosa, os trilhos se tornaram mais sinuosos, diminuindo sua velocidade total. E como as duas garotas estavam passando pelos picos… Momo avistou exatamente o que esperava.
“Cinco… quatro…”
A Executora assistente começou uma contagem regressiva. Confusa com a súbita série de eventos, Akari observou com uma expressão intrigada.
“Três… dois… um… zero.”
Assim que Momo terminou, o trem entrou em um túnel.
Em seguida, o interior do trem se encheu de luz.
O brilho emitido pelos motores Etéreos encheu a passagem subterrânea e inundou as janelas. O vagão de Akari e Momo não foi exceção, é claro. A Luz Etérea entrou pela janela que Momo abriu.
Akari arregalou os olhos para o brilho nebuloso da luminosidade artificial. Porém, em pouco tempo, a locomotiva saiu do túnel.
A luz solar resplandeceu e cancelou o brilho fraco da Luz Etérea.
“…Então?”
Como Akari estava acostumada a viajar por planícies, ela nunca encontrou um túnel antes. Quando a garota ficou boquiaberta em consequência da visão maravilhosa, Momo olhou para ela com uma cara séria.
“Entusiasmante o bastante para você?”
“…Hrmmph!”
A boca de Akari se contorceu em uma careta. Ela inflou as bochechas e se virou, tentando esconder suas emoções óbvias por despeito por Momo.
“Nem um pouco!”
Momo sorriu presunçosamente.
Ela venceu essa rodada.
*
Muito atrás do trem programado de Momo e Akari, outra locomotiva estava rodando na mesma linha.
Essa tinha um total de dez vagões, desde o motor na frente até o vagão de observação na parte traseira. Suas rodas estalavam contra os trilhos, empurrando-a sempre para frente. Deve ter parecido muito mais poderoso do que qualquer trem comum para um observador externo.
Três vagões-dormitório luxuosos estavam engatados. Um aroma agradável exalava de um compartimento do primeiro vagão-dormitório.
O interior não poderia ser mais diferente do qual Momo e Akari estavam à bordo. Esse não era um trem comum que alguém poderia embarcar simplesmente comprando uma passagem barata no balcão da plataforma. Se não fosse pelo cenário passando em alta velocidade pela janela ao lado da mesa, o interior poderia ser facilmente confundido com um quarto em um hotel de primeira classe.
A passageira neste aposento em particular estava até desfrutando de uma refeição irresistível de vários pratos.
Geralmente, essa comida seria apenas servida no vagão-restaurante adjacente ao vagão-cozinha, mas essa pessoa instruiu uma atendente a trazer a comida para ela, com a mesa totalmente preparada para um jantar estilo restaurante.
Quem estava desfrutando desse serviço e comida extravagantes não era outra senão Ashuna Grisarika. Quando ela terminou o prato de frutos do mar e fez uma pausa, o prato seguinte chegou.
“Aqui está o próximo prato, Sua Alteza.”
“Qual é o prato principal?”
“Um bife filé poele, segundo me disseram. Em seguida, haverá uma sobremesa de gelatina de champanhe rosé e, por último, chá preto. Isso será aceitável?”
“Perfeito. Você sabe o que faz.”
Acenando com a cabeça para o relatório educado da atendente, Ashuna abafou uma risadinha.
A pessoa trazendo-lhe comida estava usando um uniforme de mordomo. No entanto, a pessoa em questão não era um homem. A criada fornecendo a refeição de Ashuna era uma mulher jovem o suficiente para ser considerada uma garota.
Ashuna a chamou novamente, com pleno júbilo em seu tom.
“Sabe, estou surpresa. Por mais absurdo que possa parecer vindo de quem lhe forçou a fazer isso, você realmente está se saindo muito bem.”
“Certamente não quero escutar isso de quem me colocou nesta circunstância, mas… sim, eu treinei antecipando todos os tipos de situações, portanto tenho confiança de que posso realizar a maioria das tarefas com relativa facilidade.”
“Então servir mesas enquadra-se no âmbito de suas funções? Talvez você realmente esteja preparada para se encaixar em qualquer lugar.”
Ashuna assentiu pensativamente e depois apontou para o assento em frente a ela com seu garfo. Foi um gesto indelicado, impróprio para uma dama de seu status, mas ela o fez parecer perfeitamente aceitável com seu nível absurdamente alto de pura confiança.
“Por que não se senta? Você pode servir como alguém para conversar enquanto estou comendo.”
“…Receio que devo recusar. Ainda tenho obrigações a cumprir.”
A garota mordomo rejeitou abertamente o convite e virou-se de costas bruscamente. Ela tinha que ir e voltar da cozinha muitas vezes para entregar a refeição de vários pratos desnecessariamente elaborada. O olhar de Ashuna em suas costas foi decididamente provocante enquanto ela deixava o compartimento e entrava no corredor.
O design interior de um vagão de trem tão resplandecente se estendia aos seus corredores. O piso era coberto com um carpete macio sob os pés, enquanto o teto era gravado com padrões delicados. Flores secas decoravam as paredes e preenchiam o ar com um cheiro agradável e suave que combinava bem com as outras decorações igualmente elegantes projetadas e arrumadas para tranquilizar a alma.
No corredor vazio, a garota usando traje de mordomo soltou um suspiro e puxou ressentidamente a borda de sua roupa sob medida.
“Não há nada pior do que pedir dinheiro emprestado.”
Pois, de fato, a garota sendo obrigada a usar o traje de mordomo e servir Ashuna não era outra senão Menou, uma integrante orgulhosa da Faust.
A razão pela qual uma sacerdotisa como Menou estava fantasiada e servindo o jantar de Ashuna era bem simples: Ela estava em dívida com a Princesa.
Ashuna deu a ela um traje de mordomo com o in emprestado. Sua condição para o empréstimo era que Menou agisse como uma criada.
“Ter-me como mordomo temporariamente é uma condição tão absurda para emprestar dinheiro. Não que seja totalmente inesperado de Sua Alteza Ashuna fazer algo ridículo, mas ainda assim…” Menou resmungou para si mesma enquanto se dirigia ao vagão-cozinha.
Ela estava vestida como uma garota em um traje de mordomo, não totalmente disfarçada de homem. O traje não escondia suas curvas femininas—pelo contrário, foi projetado para acentuá-las.
Diga-se de passagem, a reação de Sahara a circunstância atual de Menou foi francamente horrível. Ela não parava de gargalhar e sugerir que Menou deveria se tornar uma empregada permanente de Ashuna até que Menou finalmente a silenciou empurrando sua escritura no fundo de sua bagagem. Ela não pretendia tirá-la novamente por algum tempo.
A situação bizarra de Sahara ainda pesava muito na mente de Menou. Ela não conseguia deixar de sentir que estava perdendo algo importante, apesar de não ser capaz de identificar.
“É porque a Sociedade Mecânica estava envolvida? Não… Talvez porque foi uma conjuração que transforma a alma? Ou é algo mais…?”
Menou continuou teorizando consigo mesma enquanto fazia diversas viagens pelo corredor vazio até que toda a refeição fosse finalmente concluída.
Ashuna exibia um sorriso satisfeito enquanto tomava um gole do chá preto após a refeição. Ela parecia uma gata mimada que estava completamente acostumada a ser atendida em tudo.
“Quem diria que ter um mordomo tão excelente poderia ser tão agradável? Estou totalmente satisfeita.”
Menou, ainda usando uma roupa de criado, serviu outra xícara de chá para Ashuna.
“Alegro-me que esteja se divertindo.”
“De fato, estou.”
Claramente, Ashuna realmente estava saboreando cada momento. Menou não conhecia ninguém mais que tirasse um prazer tão profundo da vida. E ainda assim, Menou era tão diferente de Ashuna que não sentia nem o mínimo de inveja.
Pelo contrário, Menou estava muito desconfortável nesse trem. Por todos os santos, havia um artista ao vivo em um piano de cauda no vagão-restaurante. Andar de primeira classe nesse trem luxuoso enquanto não está em uma missão de infiltração parecia errado para ela.
“De qualquer modo, Sua Alteza. Creio que lhe serviria melhor simplesmente viajar com um criado normal do que me fazer fingir ser um, não?”
“O problema com empregados normais é que eles só podem executar trabalhos normais.”
“Não sei como um fato tão óbvio seja um problema…”
“Pode me culpar? Tenho plena consciência do meu hábito de meter o nariz em perigo onde quer que eu vá. Seria cruel deixar um empregado ser arrastado para uma batalha por causa dos meus hobbies.”
“…Mas a senhorita não tem intenção de se conter e comportar-se como uma princesa normal, eu vejo.”
“Se eu o fizesse, ainda seria eu mesma? Além disso, não pretendo ganhar restringindo minha natureza. Preferiria muito mais desfrutar da jornada à minha maneira.” Essa era uma lógica tipicamente egoísta para a obstinada e presunçosa Ashuna. Ela inalou o aroma de seu chá preto antes de continuar. “Neste caso em particular, tenho você em dívida comigo, claro, mas também me agrada perseguir Momo.”
Menou foi relutante em deixar Ashuna juntar-se a ela. Afinal, ela estava perseguindo Momo. Trazer Ashuna junto não parecia nada além de dor de cabeça.
Porém, como ela pediu dinheiro emprestado a essa mulher, ela não estava em posição de recusar. Ainda era melhor do que perder pateticamente o rastro de Momo porque não tinha os fundos para acompanhar. Assim, ela escolheu se tornar a atendente de Ashuna temporariamente.
“Agora, tornei-me sua patrona para cobrir os custos de encontrar Momo, mas você tem alguma ideia de onde ela possa estar?”
“Claro que tenho. O próprio ato de segui-la não será tão difícil. Com licença…” Menou pausou e pegou um mapa. “Assim que elas saírem do deserto central, a primeira parada de Momo será na mesma cidade para a qual estamos nos dirigindo.”
“Hmm? Como pode ter certeza? Se não sabemos a intenção de Momo, certamente carecemos de informações suficientes para determinar para onde ela pode viajar.”
“Não, eu posso prever a maioria dos passos de Momo.”
Vaguear e procurar às cegas era uma perda de tempo. O continente era enorme. Em circunstâncias normais, coletar informações sobre as duas fugitivas exigiria um período significativo de tempo.
No entanto, Menou sabia exatamente como a mente de Momo funcionava.
“Momo sem dúvida está viajando de trem. Atualmente, estamos seguindo-as em uma locomotiva na mesma linha… Felizmente, como este trem é mais rápido que os comuns, já devemos estar diminuindo a distância.”
“Como sabe que elas não estão viajando a pé ou de carruagem? Assim podemos muito bem ultrapassá-las.”
“Duvido seriamente. Um par de garotas viajando a pé chamaria atenção até demais e, atualmente, Momo tem alguém atrasando-a.”
Momo estava com Akari. Ela nunca escolheria ir a pé sabendo que Menou estava seguindo-a. Comparada a Menou e Momo, que foram treinadas como Executoras, Akari era muito mais devagar.
Acima de tudo, duas moças viajando juntas estavam fadadas a se destacar. Momo poderia ser capaz de vagar sem chamar a atenção de ninguém, mas não com Akari acompanhando-a. Menou usava abertamente sua túnica de sacerdotisa enquanto estava com Akari para deixar claro a todos ao redor delas que ela era uma integrante da Faust, dessa forma evitando suspeitas.
“Entendo. A garota que vi na praia no oásis, né?”
Ashuna provavelmente tinha adivinhado que Akari era uma Ádvena. Ela não aprofundou mais no assunto, mas seus olhos estreitaram por um momento.
“Mas mesmo sabendo que elas estão viajando de trem, como vamos seguir a trilha delas? Trens Etéreos devem seguir os trilhos, mas há muitas paradas onde elas podem desembarcar. As duas também podem transferir para outra linha. O que planeja fazer sobre isso?”
“Não preciso fazer nada. Enquanto eu souber qual é o primeiro esconderijo delas, não preciso seguir mais seus rastros.”
“Oh-ho?”
Uma nota de deleite fez ponta no tom de Ashuna, ao ter seu interesse despertado.
Com um olhar de soslaio para ela, Menou traçou seu dedo pelo mapa enquanto seguia o processo de raciocínio de Momo.
“Momo não pode se mover por muito tempo com Akari acompanhando. Quando ela pensar que ganhou distância suficiente, vai escolher uma cidade com tráfego frequente e esconder-se lá. Momo provavelmente está operando sob a suposição de que conseguiu me atrasar, então não escolherá uma rota muito imprudente. Tudo isso restringe onde ela escolheria se esconder por alguns dias.”
Menou era familiarizada com as características da maioria das cidades e vilas grandes do continente. Enquanto explicava sua lógica, ela apontou para um local no mapa.
“Neste caso, ela provavelmente irá para esta cidade montanhosa primeiro.”
Ashuna bateu as mãos suavemente, aplaudindo o trabalho de detetive de Menou.
“Oh, você é boa mesmo. O que acha? Não me importaria de tê-la como minha assistente permanentemente.”
“Sinto-me honrada com o convite, mas receio que devo recusar humildemente.”
Menou manteve a atitude educada de uma criada enquanto calmamente rejeitava a oferta.
Ashuna sorriu maliciosamente, sem se incomodar com a resposta fria da garota.
“Bom, se algo a fizer mudar de ideia, a oferta sempre estará de pé. Eu ficaria feliz de tê-la. Especialmente porque Momo seria obrigada a vir junto também caso eu ponha minhas mãos em você.”
“A resposta ainda é não, seja como for.”
Claramente, era isso que Ashuna realmente queria, mas não mudou a resposta de Menou. O cargo de sacerdotisa não era tão barato ao ponto dela trocá-lo por uma pequena quantia de dinheiro emprestado, sem falar em arrastar Momo com ela.
“A senhorita parece bem obcecada por Momo, Sua Alteza. Posso saber o motivo?”
“Não diria que sou obcecada, mas… além da sua força, é claro, Momo é muito divertida de observar—e ainda mais de provocar.”
“…Ela despreza a senhorita porque zomba tanto dela, sabia?”
“Está me dando um conselho como a ‘querida’ dela? Porém, é igualmente divertido se ela me odiar. Enquanto ela não for indiferente sobre mim, significa que estou em sua mente.”
O comentário de Menou não parecia ter incomodado Ashuna nem um pouco. Pela resposta dela, Menou teve que se perguntar se a palavra descarada foi inventada unicamente para descrever a Princesa Cavaleira. Ela beliscou seu uniforme de mordomo, virando os lábios para baixo.
“E este conjunto também faz parte da sua ‘provocação’?”
“Talvez, mas também é uma precaução. Não posso simplesmente tê-la me servindo vestida como geralmente está. Os problemas causados não seriam poucos se as pessoas notassem que uma sacerdotisa da Faust estava servindo uma integrante da Nobreza como eu.”
“Essa lógica faz sentido por si só, mas sua escolha particular de vestimenta me deixa perplexa.”
“Bom, há apenas duas opções para uma criada vestir: um traje de mordomo ou um de empregada. Desses dois, pensei que o de mordomo seria mais interessante.”
Suas motivações eram tão abertamente egoístas que era quase impressionante.
Ashuna parecia claramente contente ao olhar para Menou de cima a baixo. Por sua vez, Menou abandonou há muito tempo qualquer semblante de alma sensível que a faria ficar embaraçada com uma mera mudança de roupas, mas ainda não gostava de servir de brinquedo.
“Não importa, apenas pense nisto como um disfarce. Embora, suponho que eu poderia ter lhe emprestado algo do meu guarda-roupa pessoal…”
“Ficarei com o traje de mordomo, muito obrigada.”
As roupas de Ashuna não serviriam em ninguém além da própria Ashuna. Menou estava confiante de que não queria vestir nada do repertório provocante da princesa.
“Francamente. A senhorita realmente desfruta muito da vida, não é, Sua Alteza?”
“Eu não diria isso. Mesmo esta jornada é apenas uma maneira de evitar o tédio.”
“Oh?” Menou levantou uma sobrancelha.
Houve mais emoção na voz de Ashuna do que ela esperava—ou de fato do que a própria Princesa provavelmente pretendia transmitir.
E então, Menou se viu fazendo uma pergunta que não pretendia.
“Por que deixou o Reino de Grisarika, Sua Alteza?”
“Tenho certeza que você sabe. Eu não queria me envolver na briga pela linha de sucessão após a morte de meu pai. Esse é o maior motivo.”
“Então a senhorita também teve outros motivos?”
Ashuna olhou para Menou, encarando seu rosto com curiosidade.
“Você está surpreendentemente inquisitiva. Que bicho a mordeu, hmm?”
“A vingança, suponho. Como a senhorita me forçou a usar essas roupas, parece que minha língua agora está mais propensa a escorregar.”
“Entendo.” Ashuna riu do comentário farpado. “Bem, para ser franca, odeio minha irmã mais velha.”
Sua confissão trouxe um silêncio sobre o quarto.
Apenas o barulho do trem preenchia o silêncio.
Apesar de sua alegação, não havia ódio na voz de Ashuna, nem raiva, nem medo. Na verdade, a emoção parecia mais próxima da tristeza. Era um “ódio” recheado de sentimentos complexos, atípico da Princesa normalmente simples.
“Por sua irmã, deve referir-se à…”
Havia somente uma outra garota na família real de Grisarika além de Ashuna: a filha mais velha do rei.
Ela possuía bem menos presença quando comparada à amplamente famosa Ashuna. Poucas pessoas sabiam seu nome. Menou sabia, porém nada mais. Do seu ponto de vista como Executora, a princesa mais velha não tinha registros que a tornassem digna de nota, por bem ou por mal.
“Ela sempre esteve doente—foi uma pessoa frágil. Tanto que uma brisa passageira pode derrubá-la no chão. Ela passa a maior parte do dia na cama e não consegue sequer caminhar sem ajuda. Tem sido assim desde seu nascimento.”
O que isso queria dizer?
A descrição de Ashuna parecia que deveria inspirar simpatia, não desgosto. A outra princesa parecia o extremo oposto de Ashuna, mas isso não explicava o ódio de Ashuna. Embora a Nobreza ostensiva valorizasse força acima de tudo, ela não parecia ser do tipo que desprezava os fracos.
Então talvez fosse o inverso?
“Então sua irmã mais velha a detestou por ser tamanho prodígio natural?”
“Não, ela me adorava em um nível assustador… Ah, suponho que esta seja uma forma de ver. Em todo o mundo, ela é a única coisa que me amedronta. Tenho pavor do amor dela.”
Será que sua frágil irmã mais velha estava usando sua posição para perseguir Ashuna de alguma forma? A princesa não respondeu, contente ao dar de ombros.
“Se eu tivesse permanecido lá por mais tempo, ela provavelmente teria usado sua influência para me colocar no trono. Mesmo se eu voltasse agora, ela ainda poderia. Para ser sincera, não quero retornar de maneira alguma. Mas terei que fazê-lo, qualquer dia desses.” A voz de Ashuna escorria com amargura. “Esta jornada é uma forma de matar o tempo, mas também é uma fuga, um método de aproveitar meu período final de carência. Ainda não tenho resposta para o que eu realmente deveria fazer.”
“Isso é surpreendente, dada a sua propensão para decisões rápidas.”
“Sim, isso é parte do problema.”
Embora Ashuna parecesse viver conforme seus caprichos, ela ainda possuía um senso de responsabilidade. Ela não era passível de abandonar sua posição.
“E se me permite queixar-me um pouco mais com você, há a questão de meu pai ter sido executado por evocação de Ádvena. Aquilo foi uma séria inconveniência para mim, sabe? Colocá-lo na linha de fogo avançou significativamente a questão de seu sucessor.”
Akari foi trazida a este mundo pelo incidente de evocação de Ádvena no Reino de Grisarika. Se Menou lembrava-se corretamente, Ashuna fugiu do castelo real imediatamente após o fato.
“…Quem é a sua irmã, Sua Alteza?”
“Quem sabe? Pensei que você a conhecesse, mas parece que não.” Ashuna pausou para mostrar um sorriso. “Eu ficaria contente se você encontrasse a resposta em algum lugar da sua viagem.”
“É mesmo…?”
Sentindo-se zombada novamente, Menou balançou a cabeça e, enquanto as duas continuavam conversando, o trem continuava a andar.
Com a ajuda de Ashuna, Menou estava a caminho de alcançar as outras muito mais cedo do que Momo esperava.